Na semana decisiva para o tamanho da revisão da meta fiscal, governo e equipe econômica estão em busca de um discurso. Na prática, a mudança na previsão deveria ser chamada, simplesmente, de “aumento do rombo no orçamento”. Seria mais compreensível e preciso. Trata-se de obter permissão legal para entregar uma dívida extra entre R$ 11 bilhões e R$ 20 bilhões. É muito dinheiro em qualquer moeda, latitude ou sistema político.
Em maio do ano passado, quando apresentou a assombrosa meta de déficit de R$ 170,5 bilhões em 2016, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, justificou assim o susto aos brasileiros:
– A mensagem fundamental é esta: existe margem para incerteza em questões fora do controle, mas é uma meta realista e estimada dentro de critérios rigorosos(destaque da coluna) e os mais próximos possíveis das estimativas do mercado e do governo.
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Ao avisar que a situação seria semelhante em 2017, alertou que estava “calculando severamente, criticamente a realidade (...).” Na apresentação do compromisso de limitar o rombo no orçamento a R$ 139 bilhões neste ano, reiterou:
– Foi um calculo intenso, trabalho realista e sério.
Meirelles sabe o que disse e, portanto, sabe que será cobrado. Esse é um dos motivos pelos quais resistiu tanto a admitir que pode revisar a meta de rombo – o que só fez há uma semana, no último dia útil de julho. Os ensaios de justificativa para o estouro da meta – e, portanto, da necessidade de revisão – passam pela frustração de receita. O mesmo ministro que anunciou o “fim da recessão” agora terá de explicar que, como a crise afetou as empresas, refletiu-se também na arrecadação do governo.Desde o anúncio, havia ceticismo sobre a estimativa de R$ 55 bilhões em receitas, que incluíam recursos de privatizações – dependentes de condições de mercado. Faltou realismo.
Entre emendas parlamentares, bondades excedentes e benesses como a renegociação do Funrural, gastos associados ao apoio para impedir o avanço da investigação contra o presidente Michel Temer tiveram valores semelhantes aos que serão acrescidos ao rombo. Parte da distribuição a políticos não pode ser cortada, mas as não obrigatórias foram contingenciadas em ajustes fiscais anteriores. Faltou seriedade.
Exigir discurso e práticas coerentes é o mínimo que se pode fazer diante da iminente revisão.