Se a delação da Odebrecht era aquela "do fim do mundo", e a da JBS veio depois, pode ser considerada "pós-apocalíptica". Tem números e efeitos compatíveis. A empresa, conforme seus proprietários, os irmãos Joesley e Wesley Batista, pagou propina a 1,8 mil candidatos de 28 partidos. E conseguiu eleger 179 parlamentares de 19 siglas. O maior valor individual, por seus relatos, foi ao PT, o equivalente a US$ 150 milhões em contas-corrente no Exterior.
Foi a partir dos relatos dos irmãos Batista que o presidente Michel Temer passou a ser investigado por corrupção passiva, organização criminosa e obstrução à Justiça. Na história recente, isso só ocorreu com Fernando Collor de Mello, que sofreu impeachment no Congresso, mas foi inocentado no Supremo Tribunal Federal (STF) por "falta de provas".
Leia mais
CVM confirma investigações sobre a compra de dólares da JBS
Três avaliações sobre o efeito da turbulência no mercado financeiro
Gilmar Fraga: um presidente na montanha-russa
Apenas as primeiras informações que se tornaram públicas, depois de meses de um trabalho silencioso, provocaram a maior turbulência no mercado financeiro nacional em quase uma década, com queda de 8% na bolsa, que provocou baixa de R$ 200 bilhões no valor de mercado das empresas listadas. Deixou o país à beira de mais um ano de recessão – o terceiro. A situação só é comparável à ruína da Grécia, que está em depressão econômica há oito anos.
Mesmo com a recuperação parcial das perdas na bolsa e no câmbio, a situação de incerteza que gerou a turbulência permanece a mesma. Temer não renunciou, mas a sensação dos brasileiros é de que pode haver mudanças na principal sala do Palácio do Planalto a qualquer momento.
As relações de políticos transformaram a JBS em uma espécie de caixa automático, aparentemente mais generoso do que outro franco financiador, a Odebrecht. Lá, a se acreditar no relato dos delatores, havia ao menos uma forma de "meritocracia" – com o perdão da ironia fora de hora – na divisão das propinas.
Leia mais
Donos da JBS, Joesley e Wesley nunca foram mortadelas nem coxinhas
Impacto da crise política foi além da bolsa e do dólar
Seis olhares sobre o futuro da crise e do Brasil
Se essa constatação contorce o estômago, a tentativa de prever suas consequências provoca frio na barriga. Tente explicar a um estrangeiro a situação do Brasil: um presidente investigado e as duas primeiras pessoas na linha de sucessão têm inquéritos abertos por corrupção ativa, passiva e lavagem de dinheiro. E isso ocorre em um país que precisa reduzir a dívida, aumentar a arrecadação, gerar empregos, voltar a crescer.
É certo que a reação de sexta-feira, com a bolsa subindo 1,69% e o dólar cedendo 3,89%, indica que a sensação de desabamento de quinta-feira foi demasiada. Mas é bom lembrar que esse sobe-e-desce é sinal de volatilidade, típica de situações de crise.
O Brasil precisa deixar para trás a síndrome pós-apocalíptica.