Desde a noite anterior, havia expectativa de um dia tenso na economia, especialmente em seu primeiro sensor de turbulência, o mercado financeiro. A queda de mais de 10% na primeira meia hora na bolsa, que acionou o mecanismo para interromper o círculo de pânico, o chamado circuit breaker, mostrou tensão acima da esperada. No fechamento, teve a maior queda desde 2008, de 8,8% – não por coincidência, a última vez em que as transações haviam sido paralisadas por excesso de nervosismo dos investidores.
No dólar, o impacto foi histórico. A alta de 8,15% foi a maior em um período mais longo e simbólico: desde 1999, quando o país viveu uma crise cambial e adotou o regime de flutuação da moeda. Enquanto a queda na bolsa é ruim para a economia como um todo, mas tem efeito mais drástico para quem conhece os riscos do mercado, a oscilação da moeda americana embute ameaça de médio prazo.
Caso se mantenha entre R$ 3,40 e R$ 3,50 por um período prolongado, o dólar pode afetar as decisões do Banco Central sobre o juro básico. Os sucessivos cortes na taxa Selic eram uma das maiores esperanças de reação da economia. Se o crédito fica mais barato, incentiva o consumo e o investimento. Caso haja de fato uma revisão nas expectativas para o final deste mês, quando o BC decide sobre o assunto, poderá caracterizar retardo no processo de saída da recessão.
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A primeira variação positiva do PIB em dois anos está garantida, porque se esgota em março, ou seja, é uma conta já fechada. Mas se antes havia temor de que esse resultado fosse o melhor de 2017, esse medo só cresceu desde ontem. Sem aceleração e aprofundamento na redução do juro e sem avanço nas reformas que o Congresso examinava – não há mais clima –, o diagnóstico consensual dos economistas é de que a saída definitiva da crise pode ser adiada.
Ex-diretor do BC, Carlos Thadeu de Freitas avalia que, apesar da "esquizofrenia" no mercado, o desempenho de ontem esteve "razoavelmente sob controle". Embora não poucos colegas mencionem o risco de o dólar voltar a arranhar o patamar de R$ 4, onde estava há um ano e meio. Na avaliação de Freitas, o que ocorreu ontem foi uma movimentação drásticas para "zerar posições" – sair de apostas muito arriscadas.
– Não é uma tendência para os próximos dias. Quem quiser fazer apostas contra o Banco Central (ganhar com a desvalorização do real) terá de encarar um estoque de swaps (instrumento que equivale à venda de dólares e segura a cotação da moeda) e reservas cambiais na casa dos US$ 377 bilhões.
Mas avisa:
– A não saída de Temer significa um quadro de incerteza política. Se ele saísse, permitiria enxergar os próximos passos. Como não o fez, ainda deve ocorrer muita variação no mercado.