Anderson Cardoso é tributarista, mas como vice-presidente da Federasul está em contato com o debate sobre as soluções para a crise das finanças da União e dos Estados. Na avaliação do profissional, chegou a hora de retomar o debate sobre privatizações, não para vender empresas sem critério, mas para avaliar o melhor momento de fazê-lo.
Concessões e PPPs
A grande questão é se temos alternativa. Nesse ponto, a novidade não é o endividamento dos Estados, mas a crise da União. As obras mais importantes no Estado eram financiadas pelo governo federal e estão parando. É o caso da ponte do Guaíba, da BR-116. Isso leva à conclusão de não temos opções. O governo do Estado já tinha restrições, e quando o governo federal para, num país em que temos problemas estruturais evidentes, é mais um atraso na oportunidade de sanear as questões estruturais mais urgentes. Vemos competidores, nos Brics, investindo fortemente nessa área. Em momento de endividamento público alto, esse investimento não virá se não pensarmos em alternativas. Temos a oportunidade de utilizar a ferramenta para incrementar o investimento, resolvendo a insegurança jurídica que afasta investidores.
Privatização no RS
Gostaria muito que isso ocorresse. O Estado tem restrições na Constituição para vendas de participação acionária em algumas empresas estatais. O momento não propício em determinadores setores, caso do Banrisul, e há empresas que, antes de serem oferecidas à iniciativa privada, precisam ser saneadas, como a CEEE. É preciso conseguir um preço de mercado que justifique a venda. Em gestão, o setor privado pode fazer melhor do que o público. Há duas barreiras a serem superadas: a de mercado, para setores em que a venda não é interessante nesse momento, e a legal, para a qual o ideal seria aprovar uma mudança constitucional que não demandasse plebiscito para algumas vendas.
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Momento do debate
O Rio Grande do Sul está mais maduro, talvez esteja mais ciente de sua condição. É mais fácil ser contra a privatização quando o Estado está investindo do que quando Estado não tem recursos nem para o pagamento de salários. A situação deficitária é grande. É como nas nossas casas. Quando o orçamento aperta, não se pode manter os gastos supérfluos. Mesmo contra o aumento de ICMS aprovado na Assembleia, a sociedade deu um voto de confiança. Talvez possa dar um voto de confiança para medidas que prescidam de plebiscito para permitir venda. Mas são só algumas as estatais gaúchas que precisam de mudança na legislação. Para as demais, basta aprovação da Assembleia. Para setores não impactados pela crise, cujo valor não esteja depreciado, são processos que já poderiam auxiliar o Estado.
Dependência do capital externo
De fato, como se trata de infraestrutura, as empresas nacionais estão fragilizadas. Apesar de o Brasil estar barato, não se vê grande volume de investimentos aqui por conta da insegurança jurídica e institucional. Ter revisto contratos, benefícios depois questionados são riscos. A dúvida é se sempre tem algo errado. Somos muito combativos, como gaúchos, e o investidor externo quer segurança institucional. Espera a definição de uma presidente, de uma linha de ação, de regras claras para projetos que serão apresentados. Receita x passivoPrimeiro, é preciso olhar a prestação de serviços. Se o serviço prestado não tem a qualidade de que o setor necessita, não faz sentido alocar funcionários públicos nessa entidade. Essa análise precisa ser feita caso a caso, em qual é vantajoso privatizar, qual não. Mas é preciso discutir. O caso mais bem-sucedido foi o das telecomunicações, que tinha funcionários públicos atuando. Com a venda, deixou-se de alocar recursos públicos nesses segmentos. Faz sentido o Estado investir em distribuição de energia elétrica, especialmente um Estado que tem poucos recursos? Pode não ser o momento, mas é preciso debater. O Estado precisa ter companhia de mineração, de gás? Falar sobre isso não quer dizer olhar para tudo e vender tudo, mas pensar na alternativa como forma de contribuição para o saneamento da crise financeira. Do contrário, estaremos sempre nos lamentado que Estado não consegue investir, nem fazer frente a suas obrigações mais básicas.