Na lista de más notícias dadas pelos ministros do governo interino de Michel Temer, faltou uma. Falou-se em mais impostos, cortes, reforma da previdência para retardar o acesso aos benefícios, mas não se tocou em um dos principais assuntos da gestão por ora provisória: o programa de concessões e desmobilização de ativos. Afinal, com o deslanche das reformas e a volta da disciplina fiscal, esses pontos compõem o alicerce da nova gestão. Desmobilização de ativos quer dizer, como todos sabem, venda de patrimônio, também conhecida como privatização.
Temer deu um recado sutil, em seu discurso de posse, ao mencionar o tripé que o Estado precisa se sustentar: saúde, educação e segurança. Esse sempre foi o mantra do Estado mínimo. Entre esse mínimo conceitual e o que temos atualmente, há um grande espaço a explorar, desde que com cuidado. Ao filtrar a lista que contém Correios, Casa da Moeda e 230 empresas do setor elétrico, muitas das quais na mão da Eletrobras – uma das estatais que demanda capitalização, tal seu endividamento –, o governo mostra pressa na resolução.
Ao apresentar a lista como "herdada" do governo do PT, durante o qual teria sido montada "em segredo", faz uma tentativa de reduzir a previsível resistência à ideia. Privatizações sempre foram polêmicas no Brasil, e dada a forma com que a atual equipe chegou ao poder, não deve contar com uma controvérsia mais amena.
É preciso discutir esse plano à luz de outras informações. Sem ainda chegar a um número definitivo, o que deve ocorrer nesta semana, vários ministros sinalizaram que o déficit primário (sem contar os recursos para pagar os juros da dívida) de R$ 96 bilhões previsto pelo governo Dilma é uma pálida projeção do real tamanho do buraco.
Para ir preparando os espíritos, citaram R$ 100 bilhões em receita que não se confirmará, devido à recessão, e R$ 230 bilhões em restos a pagar, sem contar ainda o efeito da renegociação da dívida com os Estados. Certo, o destino de uma privatização do tamanho desejado pelo governo Temer não pode ser fechar o buraco de um ano, até porque não seria suficiente. Mas ao "desmobilizar ativos", também se estanca gastos correntes.
Ainda que passe pelas autorizações necessárias e consiga domar a polêmica, há outros obstáculos no caminho das privatizações de Temer: a fragilização das grandes empresas brasileiras, a situação da economia global e a imagem do Brasil no Exterior.
Há poucas empresas nacionais, hoje, dispostas a desembolsar bilhões de reais por um negócio de futuro incerto. A desvalorização cambial tornou o Brasil um país "barato" para investidores externos, mas parte do encanto dos emergentes se diluiu nos últimos anos, e os Brics já não têm o mesmo apelo do passado recente. Vamos precisar, muito, falar sobre privatizações.