Lentamente, desajustados tornam os ataques às escolas uma rotina. Semana passada foi no Espírito Santo. O padrão é o mesmo: culto às armas, atmosfera familiar bélica, apoio de outros celerados via internet, namoro com o nazismo, vontade de ser uma celebridade - ainda que ao avesso -, falta de noção de civilidade - sentir-se pertencendo a uma facção e não a uma comunidade.
Sabemos o que eles conseguem: ferrar a vida de muitos, incluindo a deles e de sua família. Mas o que realmente almejam com seus atos?
Os atores são adolescentes, momento da vida em que saímos de casa e buscamos um lugar na sociedade, especialmente entre os coetâneos. O que os fez buscar a inscrição social de assassino?
Certamente a resposta é múltipla, para alguém chegar a isso, muita coisa deu errado. Porém, como psicanalista aponto um fator subterrâneo: a dificuldade atual de se sentir homem. Um assassino pode ser chamado de tudo, menos de não ter coragem de matar, de transgredir a barreira da civilidade. Levará esta marca de letalidade para o resto de sua vida.
Para desvendar a questão é preciso entender as mais arcaicas e inconscientes identidades de gênero. As mulheres estão tradicionalmente ligadas à vida, elas são férteis, trazem novas almas ao mundo. Os homens atendem pelo arquétipo do guerreiro, aquele que extrai sua identidade de não ter medo da morte ao arriscar sua vida. A identidade masculina primeva dialoga com a morte. Na compreensão arcaica, a mulher é quem dá a vida e o homem é quem pode tirá-la.
Não por acaso a máscara que o atirador usa no Espírito Santo é a mesma do massacre de Suzano, uma caveira, símbolo da morte. Age vestido de soldado, a versão moderna do guerreiro.
Em subjetividades indigentes de outros valores, retornam as formas primárias de identidade. Quando um jovem está num vácuo identitário, flerta com a resposta fácil: ser homem é matar. Mas onde matar? Onde fracassou em se inserir positivamente, na escola. Pode até invocar que a inabilidade social teria sido fruto de bullying, obtendo a justificativa para seus atos covardes.
Quem matar? Pessoas que representam a sua derrota, insignificância e passividade. Portanto pessoas frágeis, como ele sentia-se.
Estas mortes são um rito de passagem terminal. Evoca-se um simbolismo arcaico, mas o que se produz é uma farsa: nem homem, nem guerreiro, nem nada, apenas um psicopata covarde.