"Correr é sacrificado: exige disciplina, força de vontade, diria até caráter." Achei curiosa a frase que veio no e-mail de um leitor que me escreveu no ano passado para, gentilmente, dividir a história dele com a corrida.
Há duas semanas, quando decidi que não correria mais a maratona de São Paulo em 24 de abril, me peguei pensando se minha força de vontade tinha ido por água abaixo, se meu caráter, como diria meu amigo, não era forte contra "o frio, o vento, a chuva inesperada, o terreno irregular, a dificuldade como um instrutor severo, exigente, que nem todos estão dispostos a suportar".
Nos períodos de fevereiro e março, sofri para completar os treinos mais longos. Fiz exames. Culpei a baixa de B12, mas a canseira prosseguiu depois de três injeções da vitamina. Depois falei mal do sol forte do fim do verão, mas constatei que as pernas não conseguiam vencer o percurso nem mesmo quando o outono se pronunciou.
A verdade é que foi difícil admitir que o freio era mental. Quando percebi, estava no meio de uma bola de neve. Sofria ao sair para a rua porque pensava na incógnita que seria o final daquele treino, se daria certo. E, a cada desilusão, era uma corrida contra o tempo, uma briga com o volume semanal de quilômetros a percorrer para estar preparada para quando chegassem os 42km de São Paulo.
Confesso que desistir foi um sentimento quase libertador. "Essa guria está louca. Do incentivo à corrida partiu para essa onda desmotivadora", poderão dizer os leitores mais assíduos. E aqui chego ao ponto que queria: foi preciso recuar para voltar a sentir o quão bom é correr. Tirar das costas do meu esporte favorito o peso da obrigação e voltar a correr para meditar, espairecer, sentir-se bem. Correr exige mesmo caráter, e isso inclui perceber as próprias fraquezas, aprender a tolerância à frustração, perceber que nem sempre se está no momento certo para um desafio e que sempre há tempo para tentar de novo.
Corrida global
Cada participante tem sua própria linha de chegada, mas, ao alcançar o terceiro ano de realização, a corrida Wings For Life World Run segue firme e forte em único propósito: arrecadar recursos para as pesquisas na cura da lesão da medula espinhal. Com realização simultânea em 34 cidades do planeta – no Brasil, a prova será mais uma vez em Brasília –, a expectativa da organização é de que 6 mil pessoas se inscrevam.
A disputa da prova é global e inusitada. Após 30 minutos da largada, um "carro perseguidor" (car catcher, em inglês) parte atrás dos corredores com velocidade determinada, que aumenta a cada hora. Quando um atleta é ultrapassado pelo veículo, a corrida termina para ele. As inscrições ainda estão abertas e podem ser feitas pelo site da Wings For Life World Run, em wingsforlifeworldrun.com.