Nunca antes na história deste país, um governo vai assumir com tamanha responsabilidade de não ferrar as coisas. Michel Temer se tornará o 37º presidente da história do Brasil sem carta branca para dar mancadas, sem período de trégua, sem entusiasmos ou apoio de massas. Ou seja, Temer andará pela corda bamba sobre um precipício político.
É por não ter chancela para bobagens, que Temer deve usar o maior poder conferido a um governante: o de ser magnânimo. Pelo estado deplorável do país, é provável que a maioria da opinião pública aplaudisse de pé a remoção instantânea de qualquer sombra de petismo. Mas se o governo for guiado pelo revanchismo, ele estará cometendo um dos muitos erros que fizeram o PT ser tão detestado por tantos.
Além de Temer precisar manter avanços sociais, ele terá de conter o cacoete petista de alardear que não havia vida honesta, inteligente e dedicada ao país antes de sua chegada ao poder. Em qualquer governo, há detentores e cargos de confiança que só estão ali por terem assinado ficha partidária e saberem bajular a pessoa certa na hora certa - e esses já deverão estar a quilômetros de distância até o fim de semana. Mas há também milhares de ocupantes de cargos em comissão, na administração direta e em estatais, que nunca militaram em partidos e foram nomeados porque são eles que têm a capacidade técnica de tocar a máquina para a frente. Se o governo Temer desperdiçar essa experiência acumulada, estará dando o primeiro grande tiro no pé.
Nas manifestações públicas, vazadas ou por terceiros, Temer tem dito que quer pacificar o país. É uma boa intenção, mas uma meta distante diante da, digamos, contrariedade com que o petismo está deixando o poder. O melhor a esta altura é tratar com mão de ferro os que sabotarem a máquina por razões ideológicas ou que queiram fazer do Estado seu quintal privado, como tanto se viu nos últimos anos. Mas Temer deve ter sabedoria suficiente para valorizar o mérito e seduzir em sua travessia da transição aqueles que não se inclinariam naturalmente para o seu lado, ocupem eles cargos atuais ou não. Isso é magnanimidade, além de imprescindível instinto de sobrevivência.
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