Nem todos hão de concordar, mas acho que já tivemos tempos bem piores.
Os saudosistas vão sacudir a cabeça, não, não, ela está otimista demais. Porém, se pensarmos um pouco, veremos que casais tinham 12 filhos ou mais para que sobrevivesse meia dúzia, pois a mortalidade infantil era tenebrosa. Casais de maridos velhos e mulheres jovenzinhas eram comuns, porque a morte durante o parto era bem comum. Higiene, antibióticos e cuidados hoje evitam isso, e temos mais crianças saudáveis, menos parturientes com problemas graves.
Também temos, eu acho, receitas demais para tudo, algumas boas outras ridículas e outras ainda prejudiciais. Meninas fazem cursinho para aprender a segurar e amamentar o bebê. Casais se afligem lendo receituários sexuais às vezes hediondos. Nunca falamos tanto em natureza, nunca tantos foram naturebas, e talvez nunca tenhamos estado tão longe dessa grande e enigmática Mãe de Todos.
Por outro lado – hoje o jogo dos prós e contras –, a meninada nunca teve tanta oportunidade de se informar, de se cuidar na vida pessoal; de escolher profissões as mais variadas, muitos ramos do Direito, da Medicina, da Engenharia, muitas profissões técnicas, muita escolha – muita dor de cabeça, claro, mas nada é de graça.
Acho que nos casamos, ou vivemos juntos, de maneira bem mais natural e espontânea, não por arranjo familiar ou interesse pecuniário. Mas, claro, tem o outro lado: a gente separa com muita facilidade, e vai deixando filhinhos... nem sempre com seus cuidados divididos entre pai e mãe de maneira harmoniosa.
Tudo porque no fundo somos animais predadores com essa camadinha de cultura, educação e gentileza, que afinal a humanidade vai adquirindo.
Não somos grande coisa, digo às vezes, brincando a sério. No fundo mais fundo, queremos ser livres, descompromissados, nada de trabalho muito duro e mal pago, nada de não olhar para o lado se a colega é linda e divertida, ou o patrão generoso e cheio de elogios. Queremos ser ricos, ser chefes, ser importantes.
Difícil ser fiel com tanta oferta, difícil ser bom com tanta tentação, difícil ser honesto com tantos enchendo bolsos e engordando contas bancárias às custas de outros, os explorados, os ignorantes ou os necessitados.
Mesmo assim, embora eu ache que temos rigor de menos na educação, corrupção de mais nos altíssimos escalões, vejo melhoras: gente presa cujo nome antes se pronunciava com voz baixa; empresas fechadas por desonestidade; toneladas de drogas de todo tipo apreendidas pelo país, e grandes traficantes presos e condenados.
Muito menos do que seria preciso, mas ainda existem amor, solidariedade, amizade fiel, relações sólidas, trabalho digno, projetos, sonhos e realizações, velhos podendo viver, jovens podendo escolher, o mundo aberto nas teclas do iPhone ou do computador, com muitos relacionamentos firmados nesse contato cibernético que alguns ainda maldizem.
De forma que, sim, andamos em tempos melhorzinhos, e afinal em alguns dias será Natal: eu acredito na confraternização que todos desejamos.