É interessante o quanto perguntamos e o quanto, por outro lado, nos conformamos em não saber coisas.
Ou: nos cansamos de perguntas e respostas. Achamos que perguntar é mais interessante do que ter explicações (essa é meio literária, meio filosófica...). Ou simplesmente estamos: entediados, distraídos, cansados, descrentes de que haja respostas honestas. Com preguiça de fazer o cérebro trabalhar tanto.
Já revelei várias vezes – como sabem, sou repetitiva, me divirto com isso, os que se cansam não me leiam – que em criança atormentava os adultos com incessantes indagações, nem sempre interessantes. Atormentava sobretudo minha pobre mãe, que, mais interessada no seu jardim ou em dobrar lindamente as camisas de meu pai, botava as mãos nas têmporas, sacudia um pouco a cabeça e dizia, entre risonha e zangada: “Pelo amor de Deus, não fale tanto, que estou bem tonta. Vá perguntar pro seu pai”.
Eu ia. Sem medo. Medo era só na hora do boletim, em geral medíocre, (“Você é tão inteligente, por que não se esforça um pouquinho só?”) ou quando era convocada ao seu escritório, sacrossanto local até encerrar as atividades às cinco da tarde. Tinha sido malcriada com a mãe, aquelas coisas bobas de sair correndo na hora do castigo, do banho, ou de arrumar os brinquedos, botar a língua de longe, e tantas coisas mais). Sem medo, portanto, eu lhe fazia as mais descabeladas indagações, desde estrelas, horizontes, morros azuis, personagens de livros, nascimentos, ventos, sol, vida e, mais tarde, morte (a essa ele respondia: “Ah, isso é mistério”).
Ele parecia ter comigo uma paciência quase infinita nessas horas, acho que se divertia um pouco com meus pensamentos sempre num galope emaranhado, ou encantamentos contemplativos que duravam longo tempo, assustando a mãe. Por que conto de novo esses episódios da infância? Porque continuo curiosa com tudo e todos, sempre desejosa de saber até o que, eu sei, vai me machucar ou entediar mortalmente.
Por que somos como somos? Por que somos quem somos? E a última, essa mortal: o que fazem os mortos depois de mortos?
Por que somos como somos? Por que somos quem somos? E a última, essa mortal: o que fazem os mortos depois de mortos? O que aprendem, ou realizam, ou esquecem, ou espiam aqui na Terra, daquele seu tão misterioso, inefugível, inevitável e intrigante lugar?
Meu irmãozinho bebê morto antes de eu nascer. Onde está? Uns respondiam: no cemitério, ele é aquele anjo de mármore com a mãozinha estendida, onde, com a avó, você coloca uma flor. Ou: ele está no céu. Brincando nas nuvens com outros anjinhos. Por uns dias, eu achava aquilo romântico e bonito, e justo.
Mas quando cresci cresceram as mortes e as dúvidas. Sobretudo depois da morte de um de meus amados filhos, essa questão me provoca intensamente. Várias vezes ao dia eu lhe pergunto, sem falar alto (ninguém na casa mereceria...): “Filho, onde você está?”. Nunca ouvi resposta, embora às vezes, quando desanimo demais, eu saiba que ele me diz: “O que é isso, dona Lya, sai dessa!”, naquele seu jeito amoroso e alegre.
E, como fazem os humanos, eu então volto a inventar a vida possível.