Uma passagem marcante das crônicas de Nelson Rodrigues, para mim, é esta: "A história tem épocas débeis mentais. Por exemplo: a nossa". Não fui conferir, talvez haja alguma modulação diferente no original. O sentido, porém, é exatamente esse. A nossa é uma das épocas débeis mentais da história.
A frase diz mais do escritor do que da época, naturalmente. Não encontrando jeito de entender a circunstância, chama-a de débil mental. É a estupefação do cronista, que capitula ao ver que sua capacidade de compreensão do presente resultava abalada, equivocada, impotente e inútil. Da nossa época, então, o que diria o Nelson?
No impasse de entender o presente, ele poderia pensar no futuro: quem vai explicar para as futuras gerações a demência atual? Ou voltar ao passado: quem já deu forma escrita ao sentimento de revolta e de protesto que sobe na garganta em épocas assim?
André Seffrin, crítico literário e antologista de larga experiência e grande qualidade, oferece uma excelente coletânea que ajuda nisso: Revolta e Protesto na Poesia Brasileira – 142 Poemas sobre o Brasil (editora Nova Fronteira). Com paciência e discernimento, Seffrin colecionou poemas que vêm de Gregório de Matos a gente jovem de hoje, como Angélica Freitas, sempre com foco preciso em poemas nos quais o Brasil é protagonista por assim dizer negativo, ou melhor, o antagonista do poeta inconformado, que ataca "políticos corruptos, magistrados ineptos, agentes públicos relapsos", figuras que estão por aí desde sempre até este infeliz tempo que habitamos.
Lamentavelmente, a antologia não pôde contar com alguns poetas de viva militância contra a opressão. Ocorreu agora o que já tem acontecido: herdeiros pura e simplesmente não aceitam ceder poemas do falecido a não ser mediante um pagamento absurdo, fora da realidade do mercado brasileiro. Ficam assim privados da leitura e do conhecimento os leitores — que, de resto, podem recorrer privadamente aos serviços nunca pagos das cópias piratas, que circulam livremente na internet.
Não importa. Um dos méritos não pequenos do livro é a qualidade e a precisão da introdução e das breves biografias que acompanham os textos selecionados. Seffrin sabe tudo do metiê e oferece em poucas linhas o mais relevante da vida e das edições correntes de cada poeta. Tem até gente inesperada, como Cruz e Souza ou Sérgio Sant’Anna, em um coro de várias vozes, a que podemos somar a nossa.