Paradeiro é o nome de um romance sutil e muito bom de ler. Lançado ano passado pela Ateliê Editorial, ganhou este ano o prêmio de melhor romance da Biblioteca Nacional. O autor é Luís Bueno, professor de literatura brasileira na Federal do Paraná e meu amigo — sim, leitor, desconfie de mim, mas eu prometo ser sincero nas minhas impressões.
O cenário é a cidade de São José dos Campos, onde o autor nasceu, mas isso, se tem relevância, é totalmente implícita. O que traz o romance é a vida de três personagens, em durações e tempos diferentes, vivendo lá, cada um tomando a palavra em um capítulo solo — uma sinfonia de três vozes, portanto.
Uma é uma senhora que veio ao Brasil ainda menina, contra a vontade, imigrante portuguesa simples, que equaciona a dureza da vida com provérbios. Outra é uma mulher também de certa idade que está doente (ela tem certeza de que seu corpo fede) e pensa que só lhe resta morrer. As duas vivem no nosso presente, ao passo que o terceiro protagonista vive nos anos 1930: é um jovem jornalista e escritor que vai a São José dos Campos para curar-se de uma tuberculose, que então não tinha remédio, quase.
Neste terceiro narrador o livro realiza um sonho de pesquisador de literatura, porque permite ao autor empregar seu conhecimento profundo e detalhado daquela geração — de Drummond, Graciliano, Erico, tanta gente. Luís Bueno faz seu personagem escrever cartas para figuras reais, num subenredo de grande interesse.
O livro é inteligente e agradavelmente lento, meditativo, e vai compondo os cenários das três vidas de modo delicado e muito consistente.
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Coisa que precisa ter um paradeiro: a maré crescente de censura, como o veto ao livro e à presença da Luisa Geisler em Nova Hartz. Um pastor vereador, o prefeito, a secretária de Educação, não sei bem em que ordem, cancelaram um contrato com a Luisa porque julgaram que seu novo livro, Enfim, Capivaras, uma trama adolescente passada numa cidade do interior do Brasil, não pode ser lido pelos alunos da cidade. Não li o livro ainda, mas o ponto é a censura. Não cabe. Não pode.