Num uber, esses dias, ouvi uma canção que me chamou a atenção fortemente – pela chatice que impunha. Uma coisa gritada, uma choradeira, em coro de duas vozes. Não pedi para o rapaz trocar de estação porque queria saber quem cantava. Era a dupla Maiara e Maraisa. Cheguei em casa e resolvi fazer uma expedição, de interesse antropológico, ao mundo dessa dupla.
Ouvi Medo Bobo, Coração Infectado e Sorte que Cê Beija Bem. Não por inteiro, porque nem a letra, nem a música, nem a interpretação são suportáveis, a menos que o sujeito queira chafurdar num sentimentalismo sem remissão. É sempre um eu declarando que perdeu o amor, que sonha com ele, que aceita voltar, que tem saudade do beijo, que tem ciúme etc. O ritmo é uma coisa indefinida, um pop tendo como matriz a velha conhecida habanera, na linha que consagrou Michel Teló (e que, acelerada, faz o gosto dos dançarinos de vanerão, mas neste caso em registro alegre).
Contei para um amigo, que disse o nome do fenômeno: sofrência. Dei um google e voilà, mais de um milhão e 280 mil ocorrências. Parece que só eu não sabia da palavra, nem de seu referente. Marília Mendonça, Jorge e Mateus, Zé Neto e Cristiano, Henrique e Diego, outro Henrique e Juliano, Fernando e Sorocaba, Luan Santana, Wesley Safadão, Matheus e Kauan, toda essa gente faz shows e ganha dinheiro esganiçando sua voz nas regiões mais agudas, investindo o que pode nas vogais para expressar, bem, a tal sofrência.
A julgar pela amostra, as tensões do mundo da polarização política de nossos dias se espalham, ecoam na forma de melodrama e sentimentalismo imediato. Imagino um eleitor estressado, talvez cansado de repassar informação torta no uats e assim manter esticada a corda em que nos equilibramos mal, que resolva ouvir alguma musiquinha para variar. Se cair na sofrência, vai apenas redundar, reiterar o que já vive.