Já arrumou um brinquedo para uma criança? Se sim, tenha certeza de que ali já mora uma amizade. E se ela acompanhou o ato, então você é majestade.
Durante a Segunda Guerra, Londres bombardeada por nazistas incessantemente, a normalidade da cidade faleceu. Londrinos se escondiam em túneis, porões para mísseis não acabarem com suas vidas.
Assim, eles precisaram se virar. Com o mais óbvio, comida. E com aquilo que não damos tanta bola assim: roupas. Ingleses viraram costureiros. Roupas em tempos de guerra viram proteção. Do frio, do calor, da vergonha. E assim milhares de pessoas em Londres costuravam, do jeito que dava. Mas o que eles mais faziam era consertar roupas gastas. Tapar furos, arrumar botões e zíperes, enfim, consertar para sobreviver.
Corta para agora. Sou filho de costureira. Dona Marlene conserta roupas. Se ela quiser, até as faz. Já fez cuecas e calcinhas para venda! Minha vida inteira na casa dos pais tinha um barulho bom de máquina de costurar.
A gente brinca que “todo mundo usa a Marlene”! E tem lá o seu fundo de verdade. Uma barra de calça? A mãe arruma. Ficou pequena a cintura? A mãe aumenta fazendo mágica que nunca entenderei. Punho comprido? Ela diminui. Furos e rasgos? Se costura com ela!
Agulhas, fitas métricas, linhas e tesoura. Tudo ela tem, tudo na nossa volta. Mas o ato de costurar consertando peças tem algo a mais.
A tranquilidade dela. O gosto daquilo. Toda paciência do mundo pra fazer algo ser reutilizado. Todo carinho para encurtar uma camisa do Messi para o neto que sai correndo de felicidade com ela certinha no corpo. Todo o servir.
O servir sem peso. O servir para o outro. A delícia de enxergar que o outro importa.
É por isso que minha mãe costura. A roupa consertada é o afago no outro. É o dar importância para outro alguém. É ser feliz pelos outros. Porque ela não cobra nada! Temos que brigar para tentar um preço pelo trabalho certeiro e demorado.
Dona Marlene? Azar das grandes grifes por não te ter lá. Sorte a nossa de saber que não é só uma costura…
É, e sempre será, em cada ponto com nó teu, amor em ver outros felizes.