Não espere justiça no futebol, Federico. Não espere. Ele é um desgraçado.
Bem feito que vimos as autoridades abaixo de chuva na premiação. Sinal de que "San Pedrov" também achou que quem merecia ganhar a Copa era a Croácia. Foi raçuda e jogou bem. Mas só faltou uma partida para o ato sublime: a final.
Essa é a avaliação, filho. Quem jogou mais a Copa? Os quadriculados. Quem jogou mais a final? Pogba, Mbappé e Griezmann. Bastou. França bi. Com razão. Porque o futebol premia quem faz gol, o ato mais difícil. Mas não pense você que o que lhe espera será tão claro assim. Pelo menos no futebol, não. E, sim, é por isso que você se apaixonará por ele.
Ninguém discorda do bom primeiro tempo croata. Todo mundo viu que foi pênalti. Mas viu daquele jeito, tipo o amigo que descobre que o melhor amigo é corno. E não fala. Quer dizer: não falaria. Porque se ninguém sabe, não existe cornitude. O vídeo viu e falou. Porque essa não é a Copa do craque. Aliás, as últimas quatro não foram. Ronaldo foi o último. Agora quem vence é o processo coletivo. E, na Rússia, o VAR.
O árbitro de vídeo estragou o jogo, filho. Porque pela primeira vez na vida o esporte mais apaixonante será justo, milímetrico. "Mas papai, ou é ou não é, certo?!". Sim. Porém, no futebol, como na vida real, não a do filtrado Instagram, a gente quer, mas não fala alto, a injustiça. Quando ela machuca, é uma dor. Quando é a favor, silêncio cômodo.
O seu pai, Federico, pela primeira vez nessa Copa está lhe dizendo algo estranho. Antes, as metáforas futebolísticas lhe ensinavam que você precisa endurecer sem perder ternura. Mas a final foi cruel demais à namoradinha do Brasil (expressão essa dos anos 70, 80 e 90 e que hoje em dia seu pai escreve com medo de ser politicamente incorreta).
A Copa, de novo, foi para o time equilibrado, certeiro e cirúrgico. Itália, Espanha, Alemanha e agora a França descobriram isso. Equilíbrio que sustentei para suportar os 12 mil quilômetros. Com essas cartinhas, meu filho, li de volta centenas de pais e mães que, por diversas consequências, vivem afastados dos filhos.
Trabalho, abandono, arrependimentos, lágrimas em textos que chegaram de todas as maneiras. Cartas para Federico foram apenas desculpas para misturar o esporte mais popular com o sentimento mais mundano, que perpetua a humanidade. Futebol e ser pai se misturam em metáforas.
Você não será perfeito como Mbappé naquele chute, Federico. Você falhará como o patético frango de Lloris. Mas, se tiver amigos em volta, competência circundando e foco, filho meu, a vida será tão bela como foi para o goleiro francês no começo da moscovita noite de 15 de julho de 2018.
Depois da falha, a taça. Se ninguém quiser ganhar a Copa, Federico, vá lá você e vença. As mais recentes e a vida são para os dinâmicos. E elas, muitas vezes, odeiam justiça.
Potter esteve na Rússia para cobrir sua terceira Copa do Mundo. De lá, ele mandou cartas ao filho, Federico, que tem três meses e ficou no Brasil. Confira todas as cartas.