Um casal e a filha pequena partiram de Porto Alegre, em 2 de setembro de 1931, para uma longa viagem. Os jornais da cidade e a Revista do Globo noticiaram o incrível plano de chegar a Nova York, nos Estados Unidos. A ideia de fazer o percurso a pé já seria suficiente para a família virar alvo dos curiosos, mas a "casa" usada na viagem causou ainda mais surpresa.
O alemão Leopoldo Carlos Lanz, a esposa Florinda e a filha Lia, 2 anos, foram atrações por onde passaram. Ele transformou um barril em moradia. No interior da pipa de 1,9 metros por 1,25 metros, foram embutidas duas camas e pequenos armários. Nas extremidades, foram abertas janelinhas. Lanz montou uma estrutura de metal para empurrar a pipa.
Sob olhar desconfiado dos moradores da capital gaúcha, a família partiu. Eles chegaram a Canoas ao anoitecer, onde inauguraram a nova "casa". Depois de quatro dias, já estavam em Novo Hamburgo. A viagem seguiu por São Sebastião do Caí e, com a penosa subida da serra, até Caxias do Sul.
Onde não tinha estrada, andavam pelo meio do campo. Em Antônio Prado, conseguiram uma barganha e compraram uma mula branca, a Francisca, que ajudaria a dividir os pesos. A menina Lia viajou montada no animal, amarrada na sela para não cair. Mesmo assim, tombou algumas vezes. Os Lanz contaram com a solidariedade de moradores pelo caminho, ganhando pouso e alimentação. Em 6 de novembro, atravessaram o Rio Uruguai em uma balsa, chegando a Santa Catarina.
Em muitas cidades, a família foi recebida como celebridade. A viagem também foi marcada por imprevistos, como problemas no barril e medo de animais silvestres. Depois de passarem por Santa Catarina e Paraná, a menina Lia comemorou o aniversário de três anos em Sorocaba, no interior paulista. Em meio à Revolução Constitucionalista, entraram na cidade de São Paulo em 12 de maio de 1932.
O Rio de Janeiro, então capital do Brasil, era o próximo objetivo. Em 25 de junho de 1932, jornais cariocas registraram a chegada da família no dia anterior. Ao Correio da Manhã, Lanz contou que deixou Berlim em 1925 em busca de emoções, empurrando um tonel por países da Europa e norte da África antes de vir ao Brasil. Questionado sobre como bancava a viagem, respondeu que remetia fotos e descrições dos locais a vários jornais, além de receber ajuda de um clube berlinense e de pessoas pelo caminho.
O jornal A Noite também descreveu a viagem, citando que Leopoldo e a esposa falavam "relativamente bem o português". Lanz contou que queria escrever um livro. A esposa reclamou que não conseguia dormir, tantos eram os curiosos à noite em volta do barril.
Imagino que vocês já devem estar curiosos para saber o desfecho. Os Lanz não chegaram a Nova York. Em Juiz de Fora, em Minas Gerais, autoridades desaconselharam a continuidade da caminhada devido à Revolução Constitucionalista. A família retornou ao Rio Grande do Sul e morou em Arroio do Meio, no Vale do Taquari.
Em 1934, Leopoldo Lanz escreveu sobre a aventura no livro Der Neue Diogenes - Mit einem Fasse quer durch Brasilien, editado pela Tipografia Grundlach, de Porto Alegre. O texto do alemão foi traduzido para o português por Wolfgang Hans Collischonn no livro O novo Diógenes: com um barril rolando pelo Brasil.
Quando saíram de Porto Alegre, jornais relataram que uma cunhada de Leopoldo partiria na viagem. Ela até aparece em foto publicada pela Revista do Globo. Nos jornais do Rio de Janeiro, a cunhada não aparece nas fotos, nem é citada nas reportagem. No livro, Lanz também não a menciona.
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