Toda vez que vejo alguém sendo indagado se prefere o verão ou o inverno, e a resposta ruma na direção do frio, eu penso, de pronto:
— Essa pessoa não tem filhos.
É que nós, mães – em especial as de filhos bem pequenos –, sabemos que a estação que outrora lembrava vinho, lareira e quem sabe um fondue de queijo, hoje vem representada por soro fisiológico, nariz escorrendo e aquelas jaquetas puffer que tornam impossível fechar o cinto da cadeirinha do carro. Isso sem falar da bombinha e um interminável contar até 10, no meu caso. Sim, meu filho, ao que tudo indica, é uma criança asmática, ainda que eu saiba que um diagnóstico mais preciso virá somente depois dos dois anos.
Foi diante desse quadro, de mãe de uma criança que apresentava dificuldade para respirar, que o inverno se tornou uma angústia pra mim desde que Gabriel nasceu. Foram algumas bronquiolites, uma internação hospitalar e o início de um monitoramento que seguimos à risca até a fase atual, em que meu filho está com um ano e cinco meses. Lembro como se fosse hoje do dia em que chegamos à emergência do Hospital Moinhos de Vento, do esforço respiratório, da saturação baixa e da frase que me tiraria o chão:
— É, mãe, ele vai ter que ficar.
Dali em diante, eu não vi mais luz. Foi como se, com meus filhos nos braços, eu avançasse por um portal escuro. Mães que já internaram seus pequenos talvez entendam. Normalmente, leitos da emergência não têm janelas. É difícil diferenciar dia e noite, são horas de angústia sem enxergar o mundo real a nossa volta.
Escrevo sobre este fato porque nós, mães de crianças com problemas respiratórios, insistimos em nos perguntar onde foi que erramos. A culpa parece apertar ainda mais o coração diante da sensação de ter falhado no dever de assegurar que nada de errado acontecerá ao bebê. Eu não deveria ter ido ao parque, eu não deveria ter levado à escola, eu deveria ter deixado ele em casa, protegido de tudo e de todos. Eu queria poder filtrar o ar que ele respira.
É uma dor profunda. Mas me lembro também, daquela madrugada, do abraço da pediatra do plantão, doutora Carol Dalri, mãe da pequena Maria e esposa de uma grande amiga. Com olhar de compreensão, ela me confortou e disse baixinho:
— Tudo bem, eu te entendo, pode chorar.
Ali, contrariando a máxima de que a mãe chora por último, eu chorei. E tive a certeza que abraço de mãe é, de fato, capaz de curar.