Eu já escrevi neste espaço que não sinto nenhuma alegria, não senti nem mesmo vontade de comemorar a condenação de Daniel Alves, quando anunciada pela Justiça da Espanha, no caso de estupro de uma mulher em uma boate naquele país. Sinto profunda tristeza pelo fato de alguém com a trajetória como a de Daniel, de superação da pobreza extrema, da chegada à Seleção brasileira, da conquista de tantos títulos no futebol e inspiração para meninos e meninas, tenha cometido um crime tão perverso como este e tenha tentado escapar da condenação mentindo e mudando sua versão sobre os fatos pelo menos cinco vezes.
Dito isto, é preciso ler de maneira muito séria, e sob a perspectiva de combate à violência contra as mulheres, a nova decisão sobre o caso anunciada pela Justiça da Espanha nesta quarta-feira (20). Para quem não acompanhou: Daniel será solto (liberdade provisória) mediante pagamento de fiança de um milhão de euros. Ele precisará cumprir regras estabelecidas pela Justiça, como não se comunicar com a vítima por qualquer meio ou procedimento e comparecer semanalmente ao Tribunal Provincial, além da retenção dos passaportes e da proibição de deixar a Espanha.
O ponto central desta decisão é o recado que ela dá à sociedade, na direção absolutamente contrária ao que defendemos como fundamental para coibir crimes de violência contra a mulher. Ao liberar Daniel, a mensagem que fica é de que um homem pode, sim, cometer crime de violência, abuso, estupro, deixar marcas na vítima, traumatizá-la, violentá-la. Basta que tenha dinheiro para que seja liberado e possa retomar sua trajetória na sociedade.
Se você for rico, portanto, fique à vontade. Não se intimide por leis, por regras, por eventuais recados que peçam respeito.
Não é não? Bem, se você é rico, ou não talvez nem seja tanto assim. O seu dinheiro te coloca superior aos demais.
Agora se você é mulher, opa, recolha-se ao seu devido lugar. Você poderá ser violentada, abusada, sentir dores, será exposta. Mas aí se vire. De um jeito. Recomponha-se.
A você, mulher, o trauma.
Ao estuprador, seja bem-vindo de volta.
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