A semana foi duríssima para todos aqueles que acompanham de perto a pandemia de coronavírus no Brasil. No Rio Grande do Sul, não foi diferente. Além de lamentar o aumento no número de mortes e de novas internações, o Estado passou a conviver com uma realidade em que a quantidade de leitos de UTI não é suficiente para atender à demanda elevada de casos graves da doença.
E mais: 60% das pessoas que chegam às Unidades de Terapia Intensiva não conseguem vencer a doença e vão a óbito.
Nos últimos dias, a Rádio Gaúcha se dedicou a ouvir profissionais que trabalham na linha de frente do combate à pandemia, entre eles médicos, enfermeiros, diretores de hospitais. Um deles, o médico Marcelo Gazzana, conversou com o programa Timeline na última quarta-feira (24).
Entre os pontos abordados, a lembrança sobre gestos simples como o uso de máscara e o ato de lavar as mãos como forma de frear a disseminação do vírus.
- Quando a pessoa sai na rua, vai no supermercado, sai em algum lugar, é mais provável (se contaminar), porque a pessoa pode estar "desarmada". Qualquer pessoa pode ser contaminante. Eu me paramento todo, enquanto médico, quando encontro com qualquer paciente. Tu tem que partir do pressuposto que qualquer um pode ser um transmissor. Por isso, é importante o distanciamento, o uso de máscara, continuar fazendo a limpeza das superfícies. Se outra pessoa usar o computador, faz a desinfecção. A lavagem de mãos é essencial - explicou.
Ocorre que, depois de quase trinta minutos de entrevista, o médico pediu espaço para que pudesse dizer algumas palavras que estavam guardadas. E o programa, obviamente, concedeu este tempo a ele. E é sobre este ponto que eu gostaria de chamar a atenção.
- Posso te pedir um segundo? - questionou.
O Luciano Potter, um dos apresentadores, respondeu que ele teria dez minutos se quisesse (o tempo que ainda restava da atração). E o desabafo veio. Para nosso espanto, um pedido de desculpas. Forte, carregado de emoção. Desculpas aos filhos pequenos. Desculpas à mãe, uma senhora, que não pôde conviver com o filho durante um ano de pandemia.
- Eu estou muito ausente. Eu tenho três filhos pequenos que em muitas vezes eu não consigo ver. E sei que isso está acontecendo com vários colegas. A gente perde o convívio com os filhos. Eles até certo ponto entendem, mas a gente sabe, são crianças. Isso é muito pesado para a gente. Eu sou profissional, mas eu também sou pai, também sou filho. Eu não visito a minha mãe há mais de um ano. Vejo ela da sacada, à distância. E mal consigo, às vezes, ligar pra ela. Isso dá um sentimento de culpa grande. Eu sei que muitos têm esse sentimento, de medo. Eu tenho medo. Eu tenho medo de meus familiares adoecerem. A gente tem muito mais medo pelos filhos, pelos pais, do que pela gente mesmo. Eu confio no que a gente faz. Mas se a coisa colapsar, não tem milagre. Se a gente não tiver respirador, não tiver médico, não ter enfermeiro, não tem milagre - desabafou.
Foi difícil não se emocionar junto. Às vezes, a gente esquece. Mas quem está na linha de frente também é humano. Também sente, também chora. Por isso, faça a sua parte. Cuide-se. Não tem milagre.