Não durou muito a persona interpretada pelo presidente da República que respeitava jornalistas, não ofendia o Congresso e se refestelava pelo país exibindo caixas de cloroquina em mãos. Neste domingo, como já deve ser de seu conhecimento, Jair Bolsonaro vestiu o traje que mais lhe senta confortável: espraguejou ao ouvir a pergunta do repórter de O Globo, ameaçou agredi-lo fisicamente e deixou sem resposta o questionamento que horas depois viralizaria nas redes sociais. Presidente, por que sua esposa, Michelle, recebeu R$ 89 mil de Fabrício Queiroz?
A ira disparada contra um profissional de imprensa diz mais sobre quem a pratica do que sobre aquele que é vítima. Cada vez que o nome de Fabrício Queiroz é mencionado, o presidente se exalta revelando que o assunto é mais incômodo do que se possa sugerir. Queiroz é ex-assessor do gabinete do filho de Bolsonaro, Flávio Bolsonaro, quando este era deputado na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. Hoje, é investigado pelo Ministério Público pela suposta prática de "rachadinha", devolução de parte dos salários por servidores do gabinete. Ou seja: dinheiro público (meu, seu, nosso) que serviu para enriquecer o bolso de alguém.
Voltemos ao episódio deste domingo e o fim do ensaiado Bolsonaro-paz-e-amor. Ao sugerir que poderia agredir fisicamente o repórter que questionara o depósito nas contas da esposa - fato revelado pela revista Crusoé -, o presidente demonstra que o tema é um calcanhar de aquiles com potencial para tirar o sono de todo o clã familiar. Não à toa o hoje senador Flávio já protagonizou uma série de movimentos para tentar fazer parar as investigações.
Caso houvesse tranquilidade, fruto da ausência de responsabilidade por parte do chefe do Executivo, bastaria uma frase, esclarecendo o tema. Não foi o que aconteceu. "Minha vontade é encher tua boca com uma porrada, tá", despejou o presidente.
Para além da postura de agressão lamentável, Bolsonaro ainda aguçou a curiosidade de quem talvez pudesse ter esquecido de um fato, no mínimo, estranho em se tratando das finanças da família Bolsonaro. Afinal, por que a primeira-dama Michelle Bolsonaro recebeu R$ 89 mil de Fabrício Queiroz? Uma questão sem resposta. E caberiam outras mais: por que o advogado da família do presidente escondeu Queiroz em sua casa? Ou como explicar a "movimentação atípica" de R$ 1,2 milhão em uma conta no nome de Queiroz entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017?
Alguém tem que responder isso daí.