A primeira vez que eu pedi sangue para a Laurinha foi em setembro de 2017. A gente não se conhecia pessoalmente. Mas nos conhecemos, eu, a mãe e o pai dela, em encontros divertidos em meio a pastéis quentinhos da dona Cristina, ali na Cristóvão Colombo.
A Carol com medo de altura, como eu. O Rodrigo, com medo dos zagueiros do Inter, como eu. A Laurinha, com medo de nada, como nenhum de nós. Intrépida e valente, ela chegou ao mundo com 27 semanas. Tente imaginar a ousadia. E ali nasceram também dois pais cuja força eu me esforço para tentar reproduzir diariamente desde então.
Carol e Rodrigo se tornaram pais de uma princesa cujo reinado se estabeleceu dentro de uma UTI neonatal. Juntos, encamparam campanhas tão intensas por doação de sangue, a ponto de o Hospital Moinhos de Vento gentilmente nos comunicar de que, por ora, já não havia necessidade e seria prudente que parássemos de mandar gente naquele momento. E de fato promovemos invasão nada silenciosa ao banco de sangue.
Eu nem era O negativo, mas fui doar também. Já me sentia parte da corrente. Na fila de espera, encontrei o namorado de uma amiga do trabalho:
— Eu sou O Negativo. A Vanessa me disse e eu vim doar.
A Camila me telefonou de Canoas:
— Estou indo amanhã.
Minha tia Cleia telefonou e disse que incluiria o nome da Laurinha nas orações. Acho que fizemos um grande furdunço, perdoados por uma boa causa. Um ano e dois meses se passaram desde aquele dia. Não foi a única campanha de sangue que fizemos. Nem a única corrente de orações.
Rodrigo e Carol continuaram na batalha e compartilharam conosco o dia-a-dia da nossa pequenininha. Eu digo “nossa” porque me senti parte daquela família. Vibrei quando a Laurinha começou a usar óculos – eu sempre achei um charme. Com a foto do sorriso para o Rodrigo. Ao final de cada cirurgia. E talvez por isso meu coração tenha se partido ao meio quando meu telefone tocou na noite de domingo com a notícia de que ela havia virado uma estrelinha.
Nesta terça-feira, quando fui buscar as últimas lembranças que nos restaram dela (porque Rodrigo e Carol decidiram doar cada pecinha de roupa), a Carol me chamou a atenção pra um detalhe: “Tu percebeu que nenhuma dessas pessoas conheceu a Laurinha pessoalmente?”.
E ali me dei conta. Nunca chegamos a estar perto. Nem eu. Nem um monte de gente que se envolveu nessa história. A UTI e os cuidados médicos sempre se interpuseram entre nós. Do que eu vi, posso te dizer pequenininha, a capela histórica nunca esteve tão cheia para uma despedida. De gente, de coroas de flores e de amor nosso por ti.