É curioso como tragédias têm o poder de despertar o melhor e o pior nas pessoas. Nos momentos difíceis, emerge o sentimento mais nobre e também o mais mesquinho. A capacidade de repensar a vida diante de uma catástrofe vem junto da insensibilidade de quem só pensa mesmo é na melhor selfie.
A onda de solidariedade que se espalhou pelas ruas cobertas de lama no Vale do Taquari levou apoio e conforto aos atingidos. Voluntários chegaram aos borbotões, em pleno feriadão, movidos pelo desejo genuíno de ajudar. Quem pôde, ficou.
Nas primeiras horas após a inundação, quando as notícias estarrecedoras da enxurrada começaram a chegar, entidades, empresas, órgãos públicos, veículos de comunicação e pessoas comuns uniram forças para arrecadar donativos. Foi preciso até pedir que suspendessem o envio de alimentos, tamanha a mobilização, que segue firme, atendendo a outras demandas. São muitas.
Mas tem o outro lado.
Além dos voluntários, chegaram os curiosos. Aos montes, inconvenientes, intrometidos, atrapalhando o trabalho de reconstrução. Gente sem noção, que a Giane Guerra definiu como “turistas de enchente”.
Muitos foram à região (e seguem indo) apenas para olhar a destruição, em uma espécie de deleite mórbido diante da tristeza alheia - muitas vezes de dentro do carro, com os vidros fechados e o ar condicionado ligado. Para tirar fotos. Para postar nas redes sociais. Para ganhar "likes".
Triste.
Houve, também, quem espalhasse desinformação, as famosas “fake news”, de todos os tipos: envolvendo política (sim, de novo) e sugerindo conspirações e causas obscuras para a tragédia, porque, afinal, "aquecimento global não existe", dizem eles... Isso sem falar naqueles (poucos) que resolveram vender produtos de primeira necessidade a preços superfaturados - é a velha turma que não perde a oportunidade de tirar vantagem de tudo, até do drama alheio.
Um evento extremo como o que atingiu o Vale do Taquari deveria ser suficiente para desencadear uma reflexão coletiva, sobre nós, sobre a humanidade, sobre o que de fato é importante ou deveria ser. Quantas vezes nos pegamos reclamando de tudo? Uma tragédia como essa deveria servir para olharmos mais para os lados e menos para o próprio umbigo.