“O seu pai é o único homem que, de fato, quer ver você melhor do que ele” (Raimundo Pedroza)
Na nossa percepção, a figura de um pai é camaleônica, não porque ele necessariamente mude, mas porque nós, em boa parte do tempo de convívio, estamos em evolução.
Na primeira infância, independentemente do grau de interação, o pai será para o filhote a encarnação da soma dos super-heróis.
Desde o pirralho pretensioso, sempre disposto a testar o limite da autoridade paterna, até a idade em que, com um esboço precário de autonomia e autossuficiência, chegamos à juventude, o pai passa a exercer, como em nenhuma outra fase da vida, um modelo a ser copiado. E é deste dano emocional que se ressentem os que, por separação ou morte, perderam o pai nessa etapa.
Essa perda é irreparável, porque é na adolescência que começamos a ser testados fora do ambiente complacente do nosso ninho original. E que relaxante dispor de um parceiro para dividir a ansiedade que consome quem quer ser muito, mas tem mais dúvidas do que certezas de que, um dia, será.
Ter tido um pai nessa fase em que somos mais pretensiosos do que autônomos significa rememorar aquela figura serena que nunca teve dúvidas de que ser justo era muito mais difícil do que generoso e reconhecer que nossas memórias mais definitivas e impactantes sempre estiveram associadas à justiça, não importa o quanto tenhamos resmungado.
É nessa etapa de preparação do herdeiro que pretendemos oferecer aos desafios do mundo (e sem nenhuma certeza que conseguiremos), que a aproximação afetiva com o filho ocorrerá, ou nunca seremos mais do que pais biológicos. Aprendi com meu pai, sem que isso jamais fosse verbalizado, que o maior desafio para um pai é lograr a condição de confidente de filho, uma posição que está um degrau acima da relação convencional entre pais e filhos.
Essa conquista terá o ônus inevitável de doer todas as dores da cria, mas, em compensação, o bônus de que ninguém trai seu confidente.
Pai que é pai é um fã incondicional, capaz de se encantar com nossas conquistas mais insignificantes, simplesmente porque eram nossas. E se, porventura, adiante na vida, conseguimos algum feito que mereceu destaque, ele vai insistir, em cada reencontro, que contemos tudo outra vez, e conservará o olhar do deslumbramento ouvindo uma história requentada como se fosse a primeira vez.
Ter tido um pai é ter convivido com aventura de um ouvido atento e silencioso quando tínhamos errado e não havia nada para consolar.
Já não ter mais um pai é despertar por qualquer pequeno detalhe a lembrança da mais pura saudade e não conseguir retirar o seu nome da agenda do celular, uma década e meia depois de tê-lo perdido.
Um pai que no passado representou a certeza de uma retaguarda que na maioria das vezes não era necessária, mas tranquilizava muito saber que, se fosse, ela estava lá.
Que pena que ter pai não era para sempre.
E que droga que ninguém foi capaz de avisar que não seria.