“Nós poderíamos ser muito melhores se não quiséssemos ser tão bons.” (Sigmund Freud)
Tão depreciativo quanto nunca ter opinião é, tendo-a, blindá-la ao contraditório. Esta atitude, que se tornou uma marca do nosso tempo, resultou na curiosa contingência em que os indivíduos são valorizados não pela capacidade de acolhimento ao outro, mas pela intolerância truculenta às ideias divergentes. Quanto mais inflexível, mais será reconhecido pelos seus pares, como um confiável representante daquela facção. E em se tratando de grupos radicais, a confiança é, como se sabe, o primeiro dos requisitos a ser valorizado.
O produto final, como era previsível, são esses radicais chatos que recheiam as redes sociais de tolices e dão a impressão, depois de cada postagem, que a intenção era lançar uma isca e depois ficar de tocaia à espera de uma opinião, minimamente contraditória, para derramarem sobre o opiniático distraído todo o rancor reprimido, sem que se tenha a menor ideia de quando e em que circunstância a vida lhes inoculou esse ebola de ódio.
Se não bastasse o quanto esses tipos são originalmente maçantes e desagradáveis, ainda são doutrinados cotidianamente pelo convívio crônico com os seus amigos sectários, pois é da natureza agrupar.
Se não bastasse o quanto esses tipos são originalmente maçantes e desagradáveis, ainda são doutrinados cotidianamente pelo convívio crônico com os seus amigos sectários, pois é da natureza agrupar. Para facilitar o reconhecimento e manter distância protetora, é importante reconhecê-los de imediato, o que pode ser facilitado pela aparência desgrenhada, aversão a cores vivas ou a sorrisos desnecessários.
Como esses apetrechos são vinculados à solidão, não surpreende nos consultórios as queixas de cefaleias recorrentes, insônia, perda da libido e acidez gástrica diária.
Para tornar ainda mais difícil encontrar o meio termo saudável, que pudesse abrir a porta do diálogo estimulante, esses tipos muitas vezes ainda estão submetidos ao viés econômico, a atropelar qualquer possibilidade de isenção.
E é compreensível que, em tempos bicudos, o humano comum se preocupe em defender, e com toda a energia, o que lhe é crucial: sua sobrevivência e a dos seus amados. E que ninguém o censure por isso.
Mas, por conta disso, a percepção elementar é a que a confiabilidade de uma pesquisa que envolva comportamento humano estará, com frequência, comprometida pela estratificação social, principalmente pelo conflito de interesses.
Muitas vezes, a não valorização desses itens, que são condicionantes de mau humor (e sempre preferimos negar), pode explicar, por exemplo, a falibilidade de pesquisas eleitorais, esse território falacioso onde crenças e comportamentos são rotulados como avançados ou retrógrados, sem que os adjetivos possam ser explicados.
Com tantas variáveis deturpadoras da verdade, qualquer enquete sobre líderes ou doutrinas devia obrigatoriamente restringir-se aos que não dependam do governo, seja qual for a cor partidária. Se não, como dar valor à opinião, por exemplo, de um artista famoso que recebia milhões através de uma lei destinada apenas a impulsionar carreiras de jovens emergentes e que, corrigida a aberração, subitamente, viu o seu filão secar?