A sociedade que precedeu a internet era chamada por Michel Foucault de sociedade disciplinar, na qual a prática vigente era a da prestação de contas aos superiores, fossem eles o patrão, a família ou o país.
Com a chegada das redes sociais e tudo o que elas causaram nas nossas vidas e no conjunto da sociedade, mudamos de rumo e sentimo-nos estimulados a gerir nossos caminhos, com a aparente vantagem de sermos nossos próprios patrões. A consequência, ingenuamente ignorada num primeiro momento, foi que como donos exclusivos do nosso destino estávamos eliminando os outros, aqueles que tão comodamente apontávamos como os culpados preferenciais sempre que dava tudo errado. E aí começaram os problemas: nós tínhamos que reconhecer que nem sempre éramos perfeitos nas escolhas e nas mudanças de rumo, que agora, por puro azar, tinham se tornado mais frequentes.
A euforia pela sensação de liberdade, que logo se percebeu era falsa, deu-nos não apenas a autonomia nas decisões, mas impôs-nos a responsabilidade de arbitrarmos o nosso próprio desempenho. Em resumo, o alívio pela pressão que antes vinha de fora tinha sido substituído, e com muita intensidade, pela que vinha de dentro.
Para alcançar a felicidade é preciso ralar; ninguém aprende felicidade lendo sobre a coragem dos outros.
Isso explica em grande medida a crescente ansiedade pela antecipação de objetivos, muito frequente e mais intensa em jovens imaturos que, de repente, se descobriram promotores e juízes de si mesmos, num sistema judiciário particular, original e cruel, em que tudo o que fosse postado pelo pretensioso podia ser usado contra ele pelos sedentos jurados anônimos das redes sociais.
Também aqui somos diferentes. As atitudes diante destas descobertas divergem de acordo com a personalidade dos envolvidos. Os fortes, menos numerosos do que supomos, contando com a ajuda de fatores soprados pelo vento a favor, em local e circunstância, se afirmam e são reconhecidos. Os fracos, munidos de temperamentos adequados ao rótulo, sucumbem às exigências absurdas para quem nunca fora capaz de tomar decisões solitárias, mesmo diante de questões menores. E a sociedade, condicionada a idolatrar os exitosos, não parece nem um pouco interessada em relevar as indecisões desses desamparados que capitulam na primeira encruzilhada.
Segundo o filósofo coreano Byung-Chul Han descreveu na sua Sociedade do Cansaço, a impetuosidade característica da juventude sadia, estimulada pela autoajuda e encorajada pelo refrão do "nós podemos", passou a fazer parte fundamental de um novo manual da felicidade a qualquer custo. Ignorando que querer ser é essencial para vir a ser, mas isoladamente não é determinante que se consiga. Faltava a primeira lição a ser aprendida: para alcançar a felicidade é preciso ralar; ninguém aprende felicidade lendo sobre a coragem dos outros.
O preço pago pela mudança de estratégia na busca obstinada do sucesso, que infelizmente não é alcançável por todos, tem gerado um aumento significativo de doenças como depressão, transtornos de personalidade e síndromes como hiperatividade e burnout.
Curiosamente, correndo por fora e tentando fazer crer que "por aqui, tudo bem", há um batalhão dos constantemente felizes, formado por um grupo altamente suspeito: o dos que têm humor modulado para a felicidade.
Como é impossível alguém estar realmente feliz o tempo todo, cuidado. Estamos diante de um dissimulado. Não obrigatoriamente um mau caráter, mas consumido pela insegurança que tenta compensar, pela aparência, uma felicidade que não se sustenta.
Ele, na verdade, é vítima de uma fraude cultural que ignora o quanto a tristeza pode ser agregadora — e como precisamos dela para conviver em igualdade de condições com os humanos, esses seres imperfeitos que crescem pela necessidade de assumir que precisam de ajuda.