Uma das experiências mais ricas que se pode enfrentar no mundo encantado da dialética é a dissecção das frases, em qualquer idioma, assumindo que nenhum instrumento de corte pode ser tão afiado como a palavra.
Se não bastasse a gravidade do que se diga, ainda se pode atormentar o interlocutor com o jeito de dizer, onde a linguagem corporal pode ser o camaleão do serial killer da comunicação, e tudo de um jeito angelical, como convém aos dissimulados.
Os sádicos, na tendência espantosa de tornar pior o que já está péssimo, se servem de metáforas, verdadeiros punhais que brilham sedentos aos olhos atônitos da vítima, que daria tudo para ter certeza do que realmente está sendo dito. E o cérebro mediano, estarrecido pela ameaça latente, mas ainda incerta, finge sorrir para aparentar firmeza, e tudo o que se vê é o medo da notícia, que agora já aperta a garganta de terror. Se não fosse tão vergonhoso, ele choraria.
“Eu posso ser sincero com você?” foi a eleita em uma pesquisa da revista The New Yorker.
Há uns quatro anos, a New Yorker publicou uma pesquisa feita em rede social para determinar qual seria a pior frase para se iniciar uma conversa. Uma relação de 10 sentenças foram oferecidas como sugestão, e os leitores do semanário puderam votar. Com mais de 75% dos votos, a frase selecionada foi: “Eu posso ser sincero com você?”. Em tese, estamos todos de acordo que nada de bom poderá vir depois desta introdução. Em termos gerais, a vitória por goleada se justifica. Mas também é verdade que existem frases, em situações específicas, que mereceriam, pelo menos, uma menção honrosa:
O chefe da seção interpelando o funcionário novato: “Não é que eu não confie em você, mas você poderia me explicar...”.
O paciente pergunta ao médico se o caso dele é muito grave e ouve uma resposta preocupante: “Eu só espero que o senhor tenha um bom plano de saúde!”.
A esposa, na incontrolável necessidade de discutir a relação, anuncia ao maridão, com frases silabadas, que: “Nós precisamos ter uma conversa”. Se este primor de amabilidade conjugal for acrescido do adjetivo “séria”, já pode ser classificada como ameaça de morte.
O patrão, preocupado com o desequilíbrio financeiro da empresa, convida o funcionário mais antigo, para um inesperado primeiro cafezinho depois de décadas, e meio constrangido dispara: “Estamos numa fase de contenção de despesas e preciso que você me ajude a te ajudar!”.
O marido, depois de mais uma sessão de bate-boca, anuncia que não está mais aguentando aquele casamento, e que o melhor é ir cada um para o seu lado. E a esposa, com o mórbido olhar de superioridade de quem sabe do que está falando, antecipa: “Por mim, tudo bem, mas eu sei dos meus direitos!”.
O guarda de trânsito, colocado estrategicamente logo depois da sinaleira, com um ar de falsa curiosidade: “O elemento é daltônico?”.
Nesta altura da crônica, me dei conta que a lista é infindável, e poderíamos inaugurar uma pesquisa, por e-mail, de diferentes frases, vividas ou ouvidas, que tenham, por cinismo, deboche ou crueldade, condições de serem classificadas como AS PIORES. Os interessados poderão se servir do endereço no alto da página. A pesquisa pretende apenas aprender um pouco mais sobre as múltiplas formas de anunciar o que ninguém quer ouvir, mas tantas vezes ouve, simplesmente porque não podemos escolher o que os outros são capazes de dizer. E claro, os colaboradores terão a confidencialidade preservada.