"A gente nunca chega sozinho", talvez essa seja uma das frases que mais tenho repetido quando me perguntam sobre meu percurso como escritor negro no sul do país. Chegar num lugar de destaque pertencendo a um grupo social que é frequentemente excluído significa olhar para trás e reconhecer o quanto os coletivos, as comunidades e os grupos são importantes. Perceber que há muita gente boa escrevendo, mas que ainda não encontra os meios de publicação e de reconhecimento.
Ler o texto Um Coletivo de Escritores Negros em Porto Alegre, da escritora Nathallia Protazio, no site de cultura Literatura RS, sobre a importância de prestar atenção na produção de autores e autoras negras em Porto Alegre, me fez pensar o quanto ainda precisamos avançar na valorização da escrita negra. O quanto precisamos avançar com a ideia de eleger apenas alguns nomes de grupos minoritários como representantes.
A literatura é vasta e infinita, por isso há um lugar ao sol para todos os tipos de produção. Pertencer a coletivos não significa que todos os escritores escrevem do mesmo jeito ou que todos pensam da mesma maneira. Aliás, esse é um dos pactos da branquitude: tentar enquadrar nossa produção em identidades fixas, encerrar nossa produção em guetos. Muito pelo contrário: estar num coletivo é justamente encontrar condições básicas para poder exercer a liberdade da escrita. Ao mesmo tempo, se fortalecer enquanto grupo dentro de um mercado editorial que ainda cria barreiras até a publicação.
Nathallia é muito precisa ao dizer que a literatura se constrói no encontro com o leitor, porque no fim das contas o que escritores e escritoras querem é uma coisa muito simples: serem lidos. Não só celebrados, mas lidos e discutidos. Lidos para além de cotas editorais, lidos de maneira orgânica e naturalizada nos espaços culturais, nas feiras, nos eventos, nos saraus e nos festivais. Os coletivos não encerram autores em guetos, os coletivos fortalecem a jornada, reivindicam espaços ao mesmo tempo em que criam outros.
Talvez precisemos olhar mais para a ideia de coletividade, não apenas no âmbito da literatura, mas na sociedade como um todo. A sociedade moderna criou a ilusão de que nos bastamos. Além disso, estamos há tempos sofrendo ataques e violências. As comunidades e os coletivos são nossos diques, nossas trincheiras onde não cultivamos ódio nem armas, mas conhecimento, afetos e arte. E deixo aqui a seguinte pergunta: quantos autoras e autores negros de Porto Alegre você já leu neste ano, caro leitor?