No ambiente cada vez mais idiota em que se encontra o debate político geral, está sendo formada uma nova e neurastênica divisão entre coisas de “esquerda” e coisas de “direita”. Era mais fácil antigamente separar umas das outras. Esquerda era ditadura do proletariado, socialização dos meios de produção, propriedade coletiva e mais do mesmo. Direita era o capitalismo, a propriedade privada e o imperialismo americano. Hoje, porém, está tudo mais complicado.
Não pergunte por que, exatamente, tal coisa é de esquerda ou de direita – muitas vezes não há resposta racional para isso. É mais prático seguir a classificação oficial em vigor no momento, e que está disponível na mídia. Elon Musk, por exemplo, é um retrato perfeito da nova sintaxe ideológica. Era de esquerda quando seu nome vinha sempre acompanhado das palavras “carro” e “elétrico” – porque o carro elétrico, já pode tomar nota, é de esquerda. Ficou de direita quando comprou o Twitter e acabou com a censura interna na plataforma – que era de esquerda até então, mas virou de direita quando Musk introduziu ali a liberdade de expressão. Ponha na sua lista: liberdade de expressão é uma das coisas mais de direita que se pode encontrar no mundo de hoje.
Ponha na sua lista: liberdade de expressão é uma das coisas mais de direita que se pode encontrar no mundo de hoje
Da mesma forma, são claramente de esquerda a máscara da covid, a “crise do clima” e os moradores de rua. São de direita os “agrotóxicos”, as pessoas que não devem nada e os que vão a manifestações na Avenida Paulista ou na Praia de Copacabana – estes podem até pleitear um certificado de “fascista” junto ao STF. Os negros são de esquerda, os brancos são de direita. São de esquerda a abóbora orgânica, as multinacionais que acham o Brasil incapaz de cuidar da Amazônia e o futebol feminino.
São de direita os pagadores de imposto, os garimpeiros e os motoboys que não querem carteira assinada. As “mulheres” são de esquerda. Os “homens” são de direita. As ciências humanas são de esquerda. As ciências exatas são de direita. O Nordeste e a PF são de esquerda. O Sul e a PM de São Paulo são de direita, com viés de “extrema direita”. Há, enfim, as balas perdidas. O ex-governador João Doria, por exemplo, é de esquerda.
É preciso estar atento, também, às variações sobre um mesmo tema. Um caso típico é o da vacina. A vacina está sendo “ressignificada”, como diria Janja; pode ser de esquerda ou de direita, conforme a doença. Se é contra a covid, pode cravar, ela é de esquerda. Já a vacina da dengue, que o governo Lula não consegue aplicar, é de direita. No mais, em caso de dúvida, consulte um jornalista. Com certeza ele lhe mostrará a escolha correta.