O ano de 2020 realmente já vai mais do que tarde – para servir a alguma coisa, na verdade, nem deveria ter vindo. Não é preciso falar do vírus chinês e do desastre que veio com ele; não há “balanço de fim de ano” que não esteja falando disso, de maneira que não existe nenhum risco de que o público fique sub-informado a respeito dessa praga.
O que marcou 2020 como um ano especialmente horrível, mais do que a covid-19, foi a incompetência abjeta da maioria das autoridades na gestão do problema — mais o seu oportunismo, sua falsidade e a malversação no uso da palavra “ciência”.
De forma quase unânime, no Brasil e na maior parte do mundo, o poder público cedeu ao pânico. É natural: diante de situações realmente adversas, governantes que não estão à altura das suas responsabilidades reagem com a fuga. Como poderiam agir com uma coragem que jamais tiveram? Deu no que se sabe: tudo o que os governos fizeram foi voltar à Idade Média, quando o único tratamento que a ignorância e a superstição conseguiam recomendar era que as pessoas ficassem “em casa”.
A covardia, como se sabe, está sempre pronta a sair do quarto escuro onde é guardada pelas pessoas; basta uma situação mais difícil para se abandonar qualquer tentativa de agir com decência. Governantes de pequeno porte, então, são os primeiros a correr para baixo da cama. Ficam ali, dando ordens por cujas consequências não correm o menor risco de responder um dia – principalmente perante a justiça penal.
A Covid-19 no Brasil foi uma desgraça para todos, mas foi um paraíso para quem tem carteirinha de “autoridade local” – governadores de estado e prefeito. Por ordem do STF, todos eles ganharam poderes de ditador em seus quintais. Numa palavra, receberam essa coisa mágica que tanto fascina os políticos: o poder de dar ou de negar licenças. O público brasileiro sabe tudo a respeito de quanto custa tirar uma licença neste país.
A ciência, ao mesmo tempo, foi transformada pelas autoridades, pelas elites e pela mídia numa questão de opinião. Em nome do “combate à pandemia” e da “prioridade à vida”, qualquer Zé Mané ganhou o direito de se manifestar como um professor de Medicina – desde, é claro, que fosse a favor da máscara, do álcool-gel e do “distanciamento social”.
Quando os ministros Lewandowski, Luiz Fux e o resto da turma no STF começam a decidir sobre vacina ou sobre os efeitos da bebida alcoólica em favor do vírus, estamos realmente com um problema: é a ignorância sem limites transformando em lei aquilo que não sabe. Quando a maioria das pessoas e das instituições acha que isso é perfeitamente natural, o problema fica pior ainda.
Infelizmente, o ano de 2020 não acaba à meia-noite do dia 31 de dezembro. Essa gente toda estará aí em 2021.