Quem nunca se perguntou, ao cruzar por alguns ônibus caindo aos pedaços pelas estradas: como pode uma sucata dessas estar liberada para uso? Pois a Polícia Civil parece estar prestes a desvendar o mistério por trás de alguns desses trastes ambulantes. Investigação da 1ª Delegacia de Polícia de Combate à Corrupção prendeu no início da semana quatro pessoas suspeitas de envolvimento num esquema de venda irregular de licenças para que veículos antigos de fretamento e turismo possam trafegar, mesmo estando fora dos prazos e condições estabelecidas por lei.
Via de regra, ônibus com mais de 20 anos de uso não podem transitar nas estradas. As exceções acontecem mediante liminar judicial e/ou licenças administrativas. Pois o delegado Max Otto Ritter, da Polícia Civil, descobriu que um corretor de seguros intermediava suborno a servidores do Daer, para que esses veículos obtivessem permissão de rodar.
Pelo menos 12 casos já estão documentados, mas podem ser milhares. Um dos presos é Gilberto Mattos da Silva, o servidor do Daer que era, até maio do ano passado, superintendente adjunto de Fretamento e Turismo na autarquia. O setor que libera os ônibus de excursão.
O próprio Mattos, em suas redes sociais, dá uma pista do que representa o setor. Em 2019 foram expedidas pelo Daer 17 mil licenças para veículos de excursão e turismo. Elas beneficiaram 2,3 mil empresas, que realizaram, ao todo, 194 mil viagens. Os números de 2020, ano de pandemia, ainda não foram contabilizados.
Mattos resolveu se calar, ao ser interrogado pelos policiais. Isso não impede que o delegado continue no rastro das irregularidades. Além de um pente-fino nas licenças concedidas pelo funcionário graduado do Daer, uma das prioridades é verificar se os ônibus liberados se envolveram em acidentes. Um caso já identificado resultou em duas mortes, numa excursão de gaúchos à Argentina. Devem existir muitos outros.
O que dirão as famílias dos mortos ao saber que os veículos trafegavam mediante licenças fraudadas? Vai demorar, mas que a Justiça preste muita atenção nesses casos. E seja rigorosa. Tanto no campo criminal como no bolso dos fraudadores.