A Polícia Federal e o Ministério Público Federal vão investigar como 54 candidatos às eleições de 2020 no Rio Grande do Sul, com bens avaliados acima de R$ 1 milhão, receberam auxílio emergencial do governo federal. Uma das regras para conseguir esse benefício (disponibilizado pelo governo federal como compensação por perdas financeiras decorrentes da pandemia da covid-19) é que o requisitante possua rendimentos ou bens em valor inferior a R$ 300 mil. A determinação consta na Medida Provisória 1.000/2020, que também direciona o auxílio a quem está desempregado e outras situações de carência, como renda per capita de até meio salário mínimo.
A revelação de que 54 candidatos milionários no RS tiraram o auxílio foi feita por GZH, por meio do confronto entre as declarações de bens no DivulgaCand (site de divulgação de candidaturas, do Tribunal Superior Eleitoral) e a lista de contemplados pelo auxílio emergencial em todo o Brasil (do Ministério da Cidadania).
GZH seguiu os passos do levantamento do Tribunal de Contas da União (TCU) divulgado semana passada, que mostrou que o auxílio emergencial foi concedido a 10,7 mil candidatos brasileiros, cujos bens declarados estão acima do teto de R$ 300 mil. Uma investigação deverá determinar como isso aconteceu.
A listagem completa de candidatos sob suspeita, feita pelo TCU, pode ser conferida neste link.
A reportagem de GZH descobriu que o Rio Grande do Sul possui 555 candidatos com patrimônio acima de R$ 300 mil que receberam auxílio emergencial, sem se enquadrarem nas regras do programa. Eles são suspeitos de cometer irregularidade, por não se enquadrarem nos quesitos estabelecidos pelo programa governamental. Esses políticos concorrem a cargos como prefeito, vice-prefeito e vereador.
Desses 555 candidatos gaúchos, 54 declararam patrimônio de mais de R$ 1 milhão. Um deles, por exemplo, informou ao TSE bens e rendas de R$ 4,5 milhões, que inclui sete áreas de terra para plantio. Mesmo assim, retirou R$ 1,8 mil do auxílio emergencial (em três parcelas de R$ 600). Alguns dos candidatos milionários tiraram quantias ainda maiores do benefício, até R$ 2,4 mil de auxílio, cada.
Dos 10 com mais bens que teriam burlado as regras do benefício, sete são produtores rurais. Todos acessaram o auxílio por mais de um mês — muitos, por quatro meses seguidos.
A superintendência regional da Polícia Federal (PF) afirma que todas as informações sobre fraude no auxílio emergencial que chegam à conhecimento da PF são analisadas. E assim será feito em relação ao material publicado pelo site GZH.
O coordenador da área criminal do Ministério Público Federal (MPF), no Rio Grande do Sul, procurador José Alexandre Pinto Nunes, vai remeter os dados contidos na reportagem para a Caixa Econômica Federal. Após confirmação das informações, serão tomadas providências.
Mas alguns procuradores já tomaram a iniciativa. Em Santo Ângelo, região que compreende dezenas de municípios, o procurador da República Osmar Veronese tem proposto a quem burlou as regras do auxílio emergencial um acordo para evitar condenação por estelionato. A pessoa assina documento se comprometendo a devolver o benefício e, além disso, depositar R$ 5 mil em conta do Judiciário, destinados a alguma entidade assistencial.
— É uma forma de compensar o prejuízo causado. Isso é oferecido a quem tem bons antecedentes. A pessoa pode parcelar a quantia — resume Veronese.
O Ministério Público Estadual também vai examinar a lista, informa o promotor Rodrigo Zílio, coordenador do Gabinete Eleitoral. Os indícios, porém, são maiores em relação a crimes comuns e não quanto a delitos eleitorais.