O Rio Grande do Sul possui 555 candidatos, nas eleições de 2020, que tiraram auxílio emergencial sem se enquadrarem nas regras do programa. É o que constatou GZH a partir do cruzamento de dados do Tribunal Superior Eleitoral com os do Ministério da Cidadania (que disponibiliza o auxílio).
Cada um desses 555 candidatos declarou patrimônio superior a R$ 300 mil — e uma das regras do auxílio emergencial, disponibilizado pelo governo federal como compensação por perdas financeiras decorrentes da pandemia de covid-19, é que o requisitante possua rendimentos ou bens em valor inferior a esse teto. A determinação consta na Medida Provisória 1.000/2020, que também direciona o benefício a quem está desempregado e outras situações de carência, como renda per capita de até meio salário mínimo.
Levantamento do Tribunal de Contas da União divulgado semana passada mostrou que o benefício foi concedido a 10,7 mil candidatos brasileiros com bens acima do valor citado. Uma investigação deverá determinar como isso aconteceu. O TCU revelou na tarde desta sexta-feira (6) os nomes dos políticos que retiraram o auxílio. É uma lista provisória, porque não expurga nomes de quem devolveu o dinheiro. Aqui, o link da listagem do Brasil.
GZH fez o levantamento do Rio Grande do Sul, mediante confronto entre as declarações de bens no DivulgaCand (site de divulgação de candidaturas, do TSE) e a lista de contemplados pelo auxílio emergencial em todo o Brasil (do Ministério da Cidadania). A reportagem descobriu centenas de gaúchos com patrimônio pessoal declarado superior a R$ 300 mil e que foram contemplados com o auxílio emergencial. Eles são suspeitos de cometer irregularidade, por não se enquadrarem nos quesitos estabelecidos pelo programa governamental. Esses políticos concorrem aos três cargos em disputa no pleito deste ano: prefeito, vice-prefeito e vereador.
Dos 555 candidatos gaúchos que aparecem como beneficiados sem se enquadrarem nas regras, 54 declararam patrimônio de mais de R$ 1 milhão (a lista do TCU mostra 65 porque não excluiu os que devolveram o dinheiro). Um dos que retirou o auxílio, por exemplo, informou ao TSE bens e rendas de R$ 4,5 milhões, que inclui sete áreas de terra para plantio. Mesmo assim, retirou R$ 1,8 mil do auxílio emergencial, em três parcelas de R$ 600. Alguns dos candidatos milionários tiraram quantias ainda maiores do benefício, até R$ 2,4 mil de auxílio, cada.
Dos 10 com mais bens que teriam burlado as regras do auxílio emergencial, sete são produtores rurais. Todos acessaram o benefício por mais de um mês — muitos, por quatro meses seguidos.
O TCU alerta que:
— Os resultados são apenas indícios de renda incompatível com o auxílio.
— Há risco de erro de preenchimento pelo candidato.
— Há risco de fraudes estruturadas com dados de terceiros.
— Só o Ministério da Cidadania pode confirmar se o pagamento é indevido
A respeito do assunto, o ministro Bruno Dantas, do TCU, desabafou, em sessão na semana passada:
— Causa perplexidade imaginar que uma pessoa que tenha patrimônio dessa monta e, mesmo assim, se disponha a solicitar o recebimento de auxílio emergencial, possa vir a ser eleita e gerir a coisa pública e a vida da comunidade — disse Dantas, ao apresentar relatório sobre irregularidades encontradas no benefício governamental.
O governo federal tenta encontrar explicações. A Dataprev, responsável pelo cruzamento de dados do auxílio emergencial, ressalta que nos critérios estabelecidos pelo Ministério da Cidadania não havia previsão legal para verificação do patrimônio dos requerentes, o que possibilitou inconsistências cadastrais e omissões na renda domiciliar na inscrição para receber o benefício.
Outra falha pode ser a inclusão automática do candidato no Cadastro Único do governo federal, sem que ele se enquadre nas regras do programa. Isso explicaria o caso daqueles que receberam o benefício sem requisitá-lo. Todos os que estavam relacionados no Cadastro Único até o dia 2 de abril tiveram seus dados analisados e, para aqueles considerados elegíveis, a concessão do auxílio emergencial foi automática (em muitos casos sem analisar os bens do requisitante).
Como checar
A maneira de checar se o candidato burlou as regras do auxílio emergencial deve ser feita em duas etapas de consulta.
1 - A primeira é colocar o nome completo dele no Portal da Transparência do Ministério da Cidadania, que revela quem foi beneficiado pelo auxílio emergencial.
No lado esquerdo da tela é preciso colocar, no campo busca livre, o nome completo do candidato (sem acento). A seguir, preencher os seguintes dados requisitados no lado esquerdo da tela: mês da disponibilização (melhor colocar de abril a outubro), Unidade da Federação e o Município. Feito isso, aperte no lado direito "procurar" e vai aparecer quanto de auxílio foi retirado pelo candidato.
2 - A segunda etapa é conferir o patrimônio do candidato, pelo site Divulgacand, do Tribunal Superior Eleitoral. Acesse aqui o link referente a candidatos do Rio Grande do Sul.
É preciso clicar no nome do município desejado. Depois, tipo de candidatura (prefeito, vice-prefeito ou vereador). Por último, buscar o nome completo do candidato ou apelido. Aparecerá na tela a foto e os dados principais do candidato.
Feito isso, é necessário clicar, no lado esquerdo da tela, o ícone "Lista de Bens Declarados". Ele apresenta a relação de bens e dinheiro divulgada pelo candidato. Se o valor for superior a R$ 300 mil, ele não poderia sacar o auxílio emergencial.