A prisão de José Dirceu, o ex-ministro mais poderoso do primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em agosto de 2015, propiciou à Operação Lava-Jato o rastreamento de uma rede internacional de repasses de dinheiro de empreiteiras brasileiras para governantes e ex-governantes peruanos. Começava aí o calvário de Alan García, que presidiu o Peru entre 1985 e 1990 e de 2006 a 2011. Não só o dele, como também de outros mandatários do vizinho país.
Zero Hora foi um dos primeiros órgãos de imprensa a ter acesso à agenda de Alan García e também ao rastreamento de voos feitos por Dirceu ao Peru. Na época, o ex-ministro da Casa Civil de Lula era consultor das empreiteiras brasileiras e realizou cinco viagens ao território peruano, entre 2007 e 2011. Em 23 de janeiro de 2007, início do governo de García, o ex-ministro brasileiro foi recebido no palácio pelo então presidente.
Dirceu atuava como lobista de empreiteiras como Engevix e OAS, ambas envolvidas no desvio de dinheiro de contratos da Petrobras. O interesse das empresas era conquistar projetos no Peru e, para isso, convocaram os serviços do ex-ministro como "consultor". Ele, por sua vez, fez repasses de dinheiro periódicos por meio da JD Consultoria (empresa pertencente a Dirceu) para uma conhecida sua no Peru, a brasileira Zaida Sisson.
Zaida é mulher de Rodolfo Beltrán Bravo, que foi ministro da Agricultura do Peru no governo Alan García. Ela também é investigada pela Lava-Jato.
Zaida recebeu 20 transferências bancárias realizadas pela JD Consultoria (de Dirceu), entre 16 de janeiro de 2009 e 16 de novembro de 2011, que somam R$ 364.398. Conforme declarações de um dos delatores da Lava-Jato, o lobista Milton Pascowitch, Zaida trabalhava para Dirceu na tentativa de obter contratos para a Engevix e para a Galvão Engenharia no Peru. Ela era ligada ao PT e, desde 2001, morava em Lima, onde passou a militar também no Apra (partido de Alan García).
Com o tempo, procuradores da Justiça peruana comprovaram que, além da Engevix, Galvão e OAS, Alan Garcia mantinha boas relações com a Odebrecht. Tanto que ele é um dos relacionados na planilha de propinas da empreiteira para governantes estrangeiros.
Dirceu, condenado duas vezes na Lava-Jato, passou anos preso, ganhou a liberdade e pode ser preso novamente _ depende do julgamento de um recurso contra as penas que lhe foram impostas. Já a Lava-Jato foi ainda mais impiedosa no Peru do que no Brasil. Garcia, que atirou contra si instantes antes de ser preso nesta quarta-feira (17), é o quarto ex-presidente peruano a ter prisão decretada por corrupção envolvendo empreiteiras brasileiras. Os outros são Ollanta Humala (que governou de 2011-2016), Pedro Pablo Kuczynski (2016-2018) e Alejandro Toledo (2001-2006). Este último só não foi preso porque fugiu para os Estados Unidos.