A Polícia Civil gaúcha deixa de contar com um dos seus mais experientes quadros, nesta semana. Após 46 anos de serviço, o delegado Cleber Ferreira, 67 anos, entrega a pistola, as algemas e o distintivo à corporação, por força de aposentadoria compulsória — em decorrência da idade.
Ferreira se tornou policial em 1972, quando a maioria dos "tiras" gaúchos em atividade hoje sequer havia nascido. Foi investigador de 1ª à 7ª classe, inspetor da 1ª à 3ª classe, até que cansou de ganhar mal e fez concurso para delegado. Chegou à 4ª classe (último grau na carreira de delegado), comandou quase todas as delegacias especializadas (que investigam só crimes de autoria desconhecida) e foi diretor da Divisão de Investigações, antecessora do atual Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic). Na fase final da carreira, chefiou, como delegado regional, todas as delegacias de bairro de Porto Alegre.
Estava atualmente na delegacia do aeroporto Salgado Filho, um serviço mais ameno. Mesmo ali foi bem-sucedido numa investigação rumorosa: o rapto e assassinato de uma servidora da Infraero, que foi conduzida para a morte no próprio carro, mediante ameaças feitas por dois andarilhos. Eles foram presos horas após o crime, graças à rápida investigação.
Ferreira sempre fugiu aos estereótipos vigentes na época em que virou policial. Nunca foi truculento e nem gostava de exibir armas, como alguns de seus colegas. Não respondeu por homicídios, sequer em legítima defesa, num tempo em que ser policial era contar com mortes no currículo.
— Tenho a satisfação de nunca ter respondido nada grave. Nunca matei alguém. Investiguei sem precisar dar tiro.
Fala macia, Ferreira sempre preferiu conversas de bastidor, uso da perspicácia e, claro, de informantes: aqueles sujeitos que sabem o que acontece no submundo e vez que outra contam ao policial. Pois é.
Esclareceu crimes rumorosos, como o de um DJ que matou os próprios pais, em ataque de fúria, em Porto Alegre. Ou o da viúva que encomendou com o amante o assassinato do marido dela. Cometido por um assaltante que simulou um roubo, mediante pagamento, conforme descobriu o delegado. Ferreira recebeu a dica de informantes, mas comprovou tudo com ciência, com uso de teste de DNA, técnica raríssima na época.
Um policial que fará falta. Deixou na polícia um representante, o filho Juliano, também delegado.