A crise vem fazendo sombra à pecuária gaúcha há mais de ano. Mas chega agora a patamares dramáticos. O valor pago por quilo vivo é o menor em 15 anos — considerando a correção da inflação. Levantamento mensal do Núcleo de Estudos em Sistemas de Produção de Bovinos de Corte e Cadeia Produtiva (Nespro) da UFRGS mostra que, em agosto, o preço caiu 8%, de R$ 4,95 para R$ 4,55 o quilo vivo. Ao mesmo tempo em que o produtor vê a renda cair, o consumidor segue pagando mais pelo produto na gôndola dos supermercados. Sete de 10 cortes pesquisados no varejo de Porto Alegre tiveram alta no preço por quilo no mês passado (picanha, maminha, vazio, contrafilé, entrecot, costela e carne moída de segunda). Dois tiveram queda (filé mignon e carne moída de 1ª) e apenas um se manteve estável (alcatra).
— A crise sempre é ruim, mas esta tem um componente mais complicado. O produtor vinha de um período de preços firmes. Isso fez ele investir, incorporando custos fixos, e agora não consegue mais reduzi-los — avalia Júlio Barcellos, coordenador do Nespro.
A turbulência no setor se consolidou no ano passado, no rastro da Operação Carne Fraca, das delações da JBS e da crise na economia brasileira. Agora, em 2018, ficou ainda mais grave. E, se em momentos anteriores o Rio Grande do Sul registrou preços melhores do que no resto do país, agora, a situação se inverte. A partir de agora, a oferta do produto ficará ainda mais concentrada no Estado, porque os pecuaristas gaúchos precisam liberar áreas de pastagens, onde o gado ficou no inverno, para o cultivo da soja. Como todos partem para a venda simultaneamente, a tendência é de desvalorização ainda maior — situação que deve perdurar por cerca de um nês, 40 dias.
— O Rio Grande do Sul está vivendo uma superoferta. No resto do Brasil, é o contrário. É o período de seca, com escassez de gado gordo — explica Fernando Velloso, da FFVelloso & Dimas Rocha Assessoria Agropecuária.
Uma das opções de negócio para o criador, o mercado de gado em pé da Turquia — que chegou a remunerar em R$ 6,50 0 quilo vivo — desandou junto com a crise econômica que atingiu aquele país.
— O valor no supermercado não baixou, enquanto o produtor está sendo descapitalizado. As margens estão desequilibradas. Me preocupam os pecuaristas que investem para produzir carne de qualidade e não estão recebendo a remuneração adequada — observa criador da Fronteira Oeste.