As cidades mais atingidas pela enchente dependem em alto grau de determinadas empresas de grande porte. A cooperativa Dália Alimentos emprega 2,8 mil pessoas e responde por 30% da arrecadação de Encantado, por exemplo. Em entrevista ao Gaúcha Atualidade, da Rádio Gaúcha, o presidente do conselho de administração, Gilberto Antônio Piccinini, relatou os prejuízos, o medo quanto ao futuro da operação da empresa e também o que viveu no dia das fortes chuvas.
Como está a operação hoje?
Temos três plantas. Estamos com operação menor na de laticínios, entre Encantado e Arroio do Meio, porque funcionários tiveram as casas invadidas pela água. A de abate de frangos está parada, mas tentaremos retomá-la com menos trabalhadores. O grande problema está no frigorífico de suínos, que foi invadido pela água e ficará parado por algumas semanas. Geradores e túneis de congelamento foram alagados, com muito produto lá dentro.
Na reconstrução, as unidades serão levadas a outro lugar?
O frigorífico tem 75 anos. Nunca aconteceu uma enchente deste porte. O Vale do Taquari tem cotas, que precisam ser repensadas. Aqui, o sistema de controle ainda é de réguas, que foram levadas pela enchente. Estamos tentando levantar os prejuízos e tornar a planta novamente viável. Se o frigorífico para, parte de Encantado vai parar, porque representa 30% dos empregos e impostos gerados no município. Já tínhamos reduzido o abate de 3 mil para 2 mil suínos por dia em função da crise das proteínas. Esses suínos estão a campo, todo dia nascem leitões. A produção é calculada, e os prejuízos são incontáveis.
Os anúncios de governos são suficientes?
Entregamos para o presidente (em exercício) Geraldo Alckmin e também para o governador (Eduardo Leite) reivindicações, que vão de linhas de créditos especiais, antecipação do pagamento precatórios a tramitação mais rápida na questão tributária. O governo, muitas vezes, fica mais de ano (para devolver). Temos impostos a restituir, PIS e Cofins. Estamos pedindo, também, suspensão temporária do ICMS sem multa, de parcelas de financiamentos, principalmente junto ao BNDES. São ações para voltar a circular o dinheiro ou ficar no caixa, porque temos que pagar a folha e a operação está parada. As perdas que nós temos no frigorífico - carnes, cortes, embutidos, máquinas - estão em levantamento ainda.
Quantos empregos a Dália gera?
São 2,8 mil trabalhadores. O maior pedido dos nossos funcionários e dos das outras empresas é: "Salvem os empregos, precisamos para recomeçar a vida." Esse é o futuro, o sangue na veia. Precisamos voltar a operar com normalidade, claro que com uma conta enorme para pagar. Após resolverem o problema das suas casas, os funcionários precisam voltar. Se começar uma demissão em massa, é o caos. Temos plantas que não tiveram problemas, dois mercados que ajudaram a abastecer de alimentos. As fábricas de rações estão com condições de voltar a operar, mas a enchente levou a silagem, as pastagens.
Como foi o dia da enchente?
Na segunda-feira, eu estava voltando de Lajeado para Encantado e a água subiu rápido. Consegui atravessar Roca Sales e chegar na minha granja. Foi uma vigília à noite, porque a água simplesmente invadiu e ficamos ilhados. Quando começou a baixar, na quarta-feira, cheguei em Roca Sales e não consegui ver aquilo. A gente desaba. Voltei, peguei um trator e comecei a abrir ruas empurrando. Era um caos. Não tenho vergonha de dizer, eu chorava ao mesmo tempo em que trabalhava. As pessoas estavam atônitas. Tínhamos que cuidar para não passar por cima delas. Nunca vi coisa igual.
O que precisa mais agora?
O convencimento das autoridades da importância da região. Precisamos de uma opinião pública forte para viabilizar o que é mais importante. A parte do alimento e da roupa está acontecendo com força, mas nossa preocupação é que, daqui uns dias, venha outro assunto na pauta e se esqueça.
Ouça a entrevista na íntegra:
Coluna Giane Guerra (giane.guerra@rdgaucha.com.br)
Com Vitor Netto (vitor.netto@rdgaucha.com.br e Guilherme Gonçalves (guilherme.goncalves@zerohora.com.br)
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