Com resultados recordes no primeiro trimestre do ano, a fabricante gaúcha de armas Taurus ultrapassou, recentemente, a Marcopolo em valor de mercado. Além disso, está planejando um forte investimento no Estado e deve inaugurar, em setembro, a ampliação de seu parque fabril em São Leopoldo, que aumentará a capacidade de produção. A expectativa é chegar ao final do ano com 2 milhões de armas produzidas. Para falar sobre isso, o programa Acerto de Contas (domingos, às 6h, na Rádio Gaúcha) conversou com Salesio Nuhs, CEO global da empresa.
Quais foram os novos recordes que a empresa bateu no primeiro trimestre e como está a reestruturação da companhia?
Os gaúchos, em especial, conhecem a Taurus. Temos mais de 80 anos no Rio Grande do Sul. Tivemos alguns problemas no passado, e aí começamos uma nova gestão na Taurus em 2018. A partir de então, fazemos resultados sempre crescentes e recordes. Resumidamente, qual a base do nosso crescimento constante? Nós reformulamos internamente a companhia, cuidamos dos processos de produção e criamos um centro integrado de tecnologia e engenharia aqui no Brasil que reúne os engenheiros brasileiros e americanos. Temos uma estabilidade muito grande na produção da Taurus e uma agilidade muito grande em lançamento de novos produtos. Quando falamos de novos produtos, falamos de tecnologia, maior valor agregado, e, assim, conseguimos majorar suas margens. A base de tudo isso é a produção. Como você viu nos resultados, fabricamos quase meio milhão de armas só no primeiro trimestre deste ano. Foram 492 mil armas! Isso aqui no Brasil, em um crescimento mais lento, porque chegamos praticamente na nossa capacidade de produção em São Leopoldo, mas que vai melhorar a partir de setembro deste ano. Estamos há 40 anos nos Estados Unidos e mudamos, em 2019, a nossa fábrica da Flórida para Geórgia. Foi uma decisão muito acertada porque dobramos nossa capacidade de produção. Lá, aumentamos a produção em 288%.
E vocês já atingiram a capacidade máxima lá?
Não, e isso é importante. Temos ainda muito o que crescer durante este ano nos Estados Unidos. Então, costumamos dizer para nossos acionistas e investidores que a Taurus surpreende a cada trimestre, mas ela sempre tem um espaço para crescer. Então, aqui no Brasil, vamos inaugurar um condomínio trazendo os seis principais fornecedores para dentro do nosso parque industrial, vamos integrar esses fornecedores na linha de produção. A partir de setembro deste ano, então, já abrimos, de novo, capacidade produtiva na unidade de São Leopoldo, que funcionará a pleno vapor a partir de janeiro. E nos Estados Unidos, continuamos fortemente. Então, batendo recorde de produção, receita líquida, Ebitda, ainda assim, temos muito mais a oferecer. Nossa gestão é focada em resultados e planejamento estratégico. Seremos, brevemente, a maior fábrica de armas leves do mundo. Esse é o objetivo estratégico da Taurus.
Veja a entrevista também em vídeo:
Na última vez que falamos, você falou isso. Naquela ocasião, falamos dos planos, investimentos grandes que a empresa tinha, tirando já esse parque industrial no Rio Grande do Sul. Logo depois daquela entrevista, teve aquela questão envolvendo a possibilidade de taxação, e o senhor se manifestou com a possibilidade de pegar os investimentos e colocar fora do Brasil. Depois, essa situação foi revertida. Como está agora?
Nós somos, aqui no Rio Grande do Sul, uma potência. Empregamos aqui em São Leopoldo quase 2,8 mil funcionários. Geramos riquezas para o Brasil, vamos aumentar ainda mais esse número agregando mais seis fornecedores. Inclusive, uma fábrica de carregadores em sociedade com empresa paulista. Nesse momento, produzimos nos Estados Unidos, mas logo que concluirmos as obras, ela virá para cá. Então, em nada acontecendo no cenário tributário e regulatório, vamos focar nossos investimentos no Rio Grande do Sul. Agora, nos Estados Unidos, temos uma fábrica na Geórgia com muitos benefícios fiscais. Fomos para aquele Estado com um investimento de U$S 42 milhões. Lá, somos muito incentivados em aumentar a capacidade de produção. Aqui no Brasil, infelizmente, não temos isso, mas uma coisa garantimos: essa estrutura que está aqui não vai ser diminuída, vamos preservar. E, sempre que for possível, vamos investir no Brasil, como estamos fazendo agora. Neste ano mesmo, aprovamos um investimento de R$ 153 milhões na nossa operação no Brasil.
Esse valor além da ampliação de São Leopoldo?
Isso. A ampliação de São Leopoldo é praticamente o prédio, porque o investimento vem dos nossos fornecedores. Será basicamente na modernização do parque industrial. A Taurus teve problemas, nossos equipamentos ficaram desatualizados. Já fizemos fortes investimentos nesses últimos três anos, o que nos favoreceu na questão de qualidade e produtividade. Tínhamos uma margem bruta, em 2017, de 13%. Estamos fechando agora este trimestre em 46%. Então, os primeiros investimentos foram mais em qualidade e produtividade. Agora, estamos investindo forte na nossa linha de produção no que tem o "estado da arte". Eu costumo dizer que aqui na Taurus, não entra equipamento que não seja do "estado da arte". Nós realmente somos uma empresa de primeiro mundo. Somos a quarta marca mais consumida nos Estados Unidos, incluindo as empresas de lá, e a primeira marca mais importada pelos americanos. Esse é nosso tamanho.
Dentro do processo de restruturação, envolvendo a questão financeira dos últimos anos, comemora esse lucro de R$ 68 milhões no primeiro trimestre, não?
Muito. Principalmente a margem Ebitda, que foi de R$ 176 milhões. É um percentual de 31,9%. Dificilmente você vê uma indústria no Brasil com margem Ebitda de 32%. Isso é louvável.
O senhor falava sobre regulação. E uma pergunta que chegou aqui é sobre a relação da Taurus com o governo federal, que se manifesta favorável às armas, mas, ao mesmo tempo, eventualmente tem críticas à Taurus e posicionamento favorável a fábricas estrangeiras. Como está a relação da Taurus com o governo?
Somos uma empresa estratégica de defesa, segundo o Ministério de Defesa. Isso nos dá uma proximidade muito grande com o governo, principalmente com os ministérios. E como somos uma empresa fortemente exportadora na área de defesa, temos também forte relação com o Itamaraty, porque tudo depende de autorização desses dois ministérios. Temos, realmente, uma posição estratégica. Com relação a essas questões, principalmente da família do presidente, isso é coisa do passado. A Taurus passou por sérios problemas de gestão e de imagem, e isso desagradou muita gente. Mas hoje, na atual situação, não vi mais nenhuma reclamação ou críticas dos filhos do presidente em relação a Taurus. Agora, existe um compromisso dos filhos do presidente com relação à abertura de mercado. E isso, para nós, não tem nenhum problema. A minha opinião é que, se o governo quiser abrir para importações - já está aberto -, se quiser incentivar, o governo é soberano nisso. Agora eu, como empresário, sempre vou defender a produção e geração de empregos aqui no Brasil, geração de impostos, melhorar a balança comercial. E se as empresas estrangeiras quiserem vir para o Brasil, que venham produzir aqui no Brasil, que venham gerar emprego e imposto aqui. E viver essa instabilidade regulatória e tributária que a gente vive. Agora, a Taurus hoje está em uma situação que extrapola essas questões todas. Somos hoje a melhor margem bruta do mundo, se comparamos com outras empresas do setor que divulgam seus resultados. Ninguém tem a margem bruta de 46%, ou margem Ebitda de 32%. Não temos problemas com concorrência, pelo contrário, somos muito mais competitivos. Recentemente, ganhamos um grande contrato nas Filipinas e outro com um país importante do continente africano, que, por questões de contrato, não podemos divulgar. Somos extremamente competitivos no mundo. Isso nos dá situação de tranquilidade, não afeta a companhia. Ao invés de ficar acompanhando todas essas questões, focamos no nosso planejamento estratégico.
E considerando esses fatores, câmbio, custo Brasil, ambiente que vocês têm nos Estados Unidos e se o cenário vai continuar assim, qual o futuro da divisão dos negócios?
A operação da Taurus no Brasil é a mais rentável por "n" motivos. Principalmente agora com essa decisão estratégica de trazer os principais fornecedores para dentro do parque industrial da Taurus, isso vai aumentar nossa capacidade. Então, guardado essas particularidades todas, vamos investir aqui em São Leopoldo porque temos a fábrica mais competitiva. E essa fábrica vai suprir, em peças, a necessidade das nossas fábricas fora do Brasil. Não só a dos Estados Unidos, mas também a da Índia, que está prejudicada por conta da pandemia.
Tem alguma sinalização sobre essa operação?
A operação na Índia não é só uma fábrica. É uma transferência de tecnologia para o governo da Índia, que está preocupado com essa questão de tecnologia na área de defesa. Então, eles fizeram um projeto, em que uma empresa privada da Índia acha uma empresa de tecnologia na área de defesa, faz uma joint-venture e transfere tecnologia para o governo. Foi isso que aconteceu lá. Está tudo correto lá, mas precisamos ir para ensinar nossos parceiros a produzir armas. Isso depende, exclusivamente, da presença física. Então, a ideia é a gente inaugurar a fábrica em setembro, desde que nossos funcionários estejam vacinados e que os funcionários indianos que vão participar dessa joint-venture também estejam vacinados. Nesse quesito, inclusive, a Taurus tem já planejado que assim que liberar vacinas para iniciativa privada, nós vamos comprar para imunizar nossos funcionários e seus familiares, para dar uma tranquilidade a mais para essas pessoas, que são fundamentais para o crescimento da Taurus. Inclusive, recentemente tivemos uma situação grave da pandemia aqui no Rio Grande do Sul, e a Taurus não teve nenhuma contaminação interna. Temos um protocolo de proteção muito grande. E também temos uma forte presença na área social. Então, vamos investir no Brasil para que continue sendo essa fábrica produtiva e que servia como uma fábrica para abastecer nossas outras unidades no mundo.
E sobre o mercado consumidor. Vocês trabalham com a possibilidade de que o mercado consumidor brasileiro venha a ter características do mercado norte-americano?
Sem dúvida nenhuma. Aliás, eu dou meu braço a torcer. Eu sempre imaginei, nesses 30 anos que tenho no segmento, que o brasileiro nunca teria uma característica de consumo como o americano, porque aqui só vendia três calibres. Mas, com essa abertura dos calibres, vemos, realmente, que o consumidor brasileiro tem as mesmas características do consumidor americano. Eu recebo no nosso WhatsApp várias fotos de consumidores mostrando que compraram mais e mais armas. Então, realmente, essa relação com o mercado de armas é muito calorosa, é muito passional. É que nem celular, saiu o modelo novo, tem que trocar. Com as armas, é a mesma coisa. Estamos muito felizes com a reação do consumidor brasileiro. E é importante falar que éramos bastante frustrados aqui. Porque a Taurus é uma fábrica de armas. Temos alguns concorrentes que não são fábricas de armas, mas de pistolas. Somos fábricas de arma. Nosso portfólio é muito grande, mas éramos frustados porque só conseguíamos vender três calibres aqui no Brasil. Então, isso mudou completamente e nos encheu de alegria, não só como indústria, mas também como mercado de consumo.
Vocês estão com problema de falta de matéria-prima?
Eu repito muito aqui com nossos diretores, que gestão é uma coisa muito séria. Desde que começamos a lidar com a pandemia, em março do ano passado, criamos um comitê de crise para lidar com a covid-19. Na primeira parte das reuniões, o comitê se preocupa com a proteção dos nossos funcionários. Somos uma atividade essencial, mas se os funcionários não estiverem com saúde perfeita, não tem como continuar. A segunda parte da reunião é o que temos que cuidar para manter a operação. E aí, envolve a questão de matéria-prima, logística, importação, entrega, tudo mais. O que criamos? Temos hoje estoque das matérias-primas estratégicas e importantes de três meses. Cheguei a alugar um galpão aqui no lado da Taurus para poder armazenar nossos insumos. Temos também seis meses de pedidos garantidos com nossos fornecedores. Isso nos dá uma certa tranquilidade para gerir e tocar nossa produção. Tanto que estamos batendo recorde de produção. Como CEO da companhia, entendo que planejamento é tudo. E trabalhamos com muito foco e fiéis a esse planejamento.
Mas vocês sentem algum efeito? Conseguem ver uma normalização desse cenário?
Isso deve, realmente, ser uma preocupação dos empresários. A Taurus tem uma situação privilegiada em relação a isso. Primeiro, porque passamos por essa pandemia sempre crescendo. Isso nos deu um fôlego financeiro e de gestão grande. Eu não vejo, realmente, que isso se estabilize. Até porque essa questão da covid-19 vai deixar um rastro forte no mundo inteiro. O que digo é: planejamento a médio e longo prazo muito forte. Temos que ter uma visão de pelo menos nove meses pra frente. Tenho três meses em casa, mais seis meses fixos. E, eventualmente, você tem uma ou outra matéria-prima que pode fugir do seu controle. Sempre tenha um plano B, um fornecedor B, onde buscar. Minha área de compras e planejamento é focada nisso: não tendo três meses em casa e três meses fixos, onde podemos buscar a matéria-prima? Dependemos muito pouco de importação aqui, talvez 7% ou 8%. O dólar também é um fator importante nesse equilíbrio. A moeda cedeu um pouco, mas chegamos a um patamar estratosférico, o que para nós é bom, porque somos fortemente exportadores, apesar de a nossa dívida também ser em dólar. A mensagem que posso deixar é exatamente essa: planejamento forte a médio e longo prazo.
Voltando ainda ao perfil do consumidor. O pessoal quer saber qual a relevância do consumo brasileiro de forças de segurança em relação ao consumidor civil?
Somos uma empresa vocacionada para produzir produtos de uso civil. Como somos fortes nos Estados Unidos, no mercado civil americano, entendemos que essa é uma vantagem competitiva para Taurus. Quando você fala de mercado civil, apesar das questões regulatórias, ele é estável. Nós desenvolvemos, nos últimos anos, produtos para o mercado policial e forças armadas no mundo inteiro. E somos muito competitivos. Então, ganhamos várias licitações no mundo inteiro. Mas uma licitação é binária: ou ganha ou perde. E aqui no Brasil, é a mesma coisa. O mercado brasileiro se ampliou bastante, é maior do que o das forças de segurança, até porque a arma é um bem durável. Então, as polícias compram e usam durante 20, 30 ou 40 anos uma arma. Então, qual o crescimento disso? É a ampliação do número de policiais. Hoje, as compras no Brasil nas áreas de segurança e forças armadas são pequenas, para acompanhar as novas nomeações. As guardas municipais são potenciais consumidores agora, mas o mercado brasileiro civil ainda é maior do que o institucional.
Para fechar, a Taurus passou a Marcopolo em valor de mercado. E o valor de mercado é como o consumidor vê o potencial futuro da empresa. Como foi para o senhor esse fato?
Eu fiquei muito feliz quando vi isso. A Marcopolo é uma grande empresa, referência no Rio Grande do Sul, e nos encheu de orgulho a ter ultrapassado em valor de mercado. Evidentemente, não fazemos nenhuma torcida contra a Marcopolo, mas para nós foi muito importante porque a Marcopolos sempre foi referência para várias empresas no Brasil todo, no mundo. A Marcopolo, por exemplo, esteve na Índia bem antes da Taurus. Então é uma referência para nós também. Então, nos enchemos de orgulho de hoje ter um valor de mercado maior do que a Marcopolo. E isso dá uma segurança para nossos investidores e acionistas. E o que dá mais segurança é que tivemos um primeiro trimestre de recorde de produção, ,e já em abril, fizemos uma média diária de armas aqui e nos Estados Unidos de 9.510 armas. Então, já aumentamos a média que era de 7,8 mil no primeiro trimestre. E falei para nosso diretor de operações: "A matemática ensina que 9.510, se você arredondar, é 10 mil". Então, se multiplicarmos esse número pelos dias úteis que temos até o final do ano, vamos passar de 2 milhões de armas produzidas nesse ano. Mais uma garantia de que vamos continuar entregando resultados positivos.
Coluna Giane Guerra (giane.guerra@rdgaucha.com.br)
Colaborou Daniel Giussani (daniel.giussani@zerohora.com.br)
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