Em comunicado enviado pouco depois da meia-noite, a Petrobras informou sobre a venda de ações da BR Distribuidora. Com ela, a estatal perdeu o controle da subsidiária, que é a maior distribuidora de combustíveis do país. Mas e quem comprou a empresa? Ainda não se sabe.
— Especula-se no mercado que grandes gestoras de recursos adquiriram pesadas posições na oferta, mas isso só se confirmará quando tivermos a primeira assembléia da companhia e os votos demonstrarem quem são os acionistas — diz o sócio da gestora de fundos Quantitas, Wagner Salaverry.
Segundo Bruno Madruga, da Monte Bravo Investimentos, não saiu o que se chama de rateio da oferta de ações, ou seja, quanto o investidor levou efetivamente do valor reservado.
— E a soma das reservas superou o valor ofertado. Ao que tudo indica, a BR Distribuidora deixa de ser uma estatal e passa a ser uma empresa privada de controle pulverizado.
A análise é a mesma de Pablo Spyer, da Mirae Asset:
- Aparentemente, foi bem pulverizado mesmo, com as ações compradas por assets. Teve pouco gringo (investidor estrangeiro), que ainda aguarda o andar da reforma da Previdência.
E o preço de venda foi bom para a Petrobras?
Wagner Salaverry, da Quantitas, vê que a BR foi "precificada" muito próximo das concorrentes privadas. Isso indica que os investidores acreditam que a nova gestão privada da companhia vá melhorar a margem de lucro e até a colocará em patamar superior às demais no mercado.
— Conseguimos medir isso comparando os múltiplos de negociação e as margens de lucro da BR Distribuidora frente às concorrentes que também são abertas em bolsa: Ipiranga, que é da Ultrapar, e Raízen, uma joint venture entre Cosan e Shell. Diria que a Petrobras vendeu as ações por um preço justo, mesmo sem ter números de eficiência operacional semelhantes aos das pares privadas.
Salaverry lembra que outras empresas são conduzidas, tranquilamente, com controle pulverizado. Uma bem conhecida é a Lojas Renner, que tem sede em Porto Alegre.
— Alguém pergunta ou sabe quem controla a Renner? Não interessa muito, certo? Ela tem um Conselho de Administração eleito por seus acionistas nas assembleias e diretores que são escolhidos por esses conselheiros para gerir o dia a dia. Enfim, a BR Distribuidora agora é uma empresa com perfil de acionistas semelhante.
Os R$ 8,56 bilhões levantados pela Petrobras irão para reduzir o endividamento da estatal. Além disso, também serão usados para investimento no segmento para o qual a empresa irá se dedicar com mais força, que é a exploração e produção de petróleo. Para os analistas e a atual direção da empresa, é onde há maior potencial de geração de lucro.
— A Petrobras deixará de ser esta empresa presente em várias atividades, muitas delas com baixo retorno sobre capital investido e que serão vendidas. Irá se tornar uma empresa de produção e exploração (E&P) de petróleo, notadamente de águas profundas e rasas — acrescenta Salaverry, da Quantitas.
E os desinvestimentos não param por aí. Recentemente, a Petrobras acelerou a venda de refinarias. Entre elas, está a Refinaria Alberto Pasqualini (Refap), que fica em Canoas, no Rio Grande do Sul. Leia mais: Petrobras divulga detalhes da venda da Refap e quem poderá comprar a refinaria do RS
Entre os demais ativos que serão vendidos, há ainda campos de petróleo em terra e campos maduros em declínio de produção. Além da diminuição da dívida, o plano de negócios da Petrobras ainda fala em otimização da receita, assim como redução de custos de produção e despesas administrativas.
Como fica o mercado
O setor de distribuição passa por um momento de forte competição e aumento da participação dos postos de bandeira branca. O market share, que é a participação de mercado, tem caído forte para as grandes. O consumidor quer preço mais baixo e deixou de ter medo de abastecer em postos sem bandeira.
— Quer preço baixo e ponto final - reforça o analista de mercado Wagner Salaverry.
Segundo o BTG Pactual, a BR opera com preços médios menores que suas pares na venda de combustíveis. A rede de lojas de conveniência da bandeira também não gera o mesmo retorno que as lojas das concorrentes.
Uma mexida maior no mercado deve ocorrer somente em um prazo de dez anos, analisa João Luiz Zuñeda, sócio-diretor da consultoria petroquímica Maxiquim. Dependerá também da venda das refinarias. Quem comprar precisa dar maior eficiência e deve existir concorrência, que abre espaço para uma queda de preços de combustíveis.
Segundo o Zuñeda, o preço da gasolina nas refinarias brasileiras é cerca de 10% superior à média do mercado internacional. Essa diferença tende a cair. No entanto, observa que o consumidor brasileiro paga de 30% a 40% mais pela gasolina na bomba do que em outros países.
— Mas aí entra o peso dos tributos. Se aumentar carga tributária, a eficiência alcançada pelo início da cadeia de combustíveis se perderá.
Diretor-presidente da Rede SIM, Neco Argenta não projeta grandes mudanças no mercado de postos de combustível. Lembrou da venda de outra parte da BR, feita em 2017 também por oferta de ações, e que já tinha dado início a mudanças na gestão.
— E praticamente não impactou no mercado. A gestão da BR Distribuidora já está bem profissionalizada e as possíveis mudanças demorarão para serem implementadas.
Edson Silva, economista-chefe da ES Petro, consultoria do mercado de petróleo e derivados, também não vê impacto nos preços dos combustíveis:
— O maior impacto da venda de ações da BR será mesmo para a gestão financeira da Petrobras. Nos preços dos combustíveis, tudo como agora.