A mais antiga e mais famosa universidade dos Estados Unidos acaba de lançar um brado que, eu espero, ecoe fortemente no Brasil. Refiro-me à criação do Council of Academic Freedom at Harvard, ou “Conselho de Liberdade Acadêmica de Harvard”. Sim, a veneranda universidade fundada em 1636 em Cambridge, Massachussetts, manda dizer aos intolerantes um retumbante “Alto lá”. E a forma como o fez foi instituindo este Conselho, iniciativa de mais de 70 professores da instituição que se mobilizaram para socorrer a liberdade de expressão e de pesquisa, hoje ameaçada, e em muitos casos abertamente reprimida, no âmbito do ensino superior norte-americano e, vale dizer, de grande parte do mundo.
As razões que impulsionam esse grupo, formado por nomes notáveis do ambiente universitário, estão apresentadas em uma espécie de texto-manifesto publicado no jornal Boston Globe. Assinado pelos professores Steven Pinker e Bertha Madras, de Harvard, o artigo desnuda um quadro de opressão e intolerância sentido na pele, e na alma, por qualquer pessoa, seja professor, seja aluno, que tenha um pensamento mais tendente a valores do conservadorismo ou que não se submeta, docilmente, à imposição do discurso “politicamente correto”. Os autores reportam o que chamam de “perda de confiança” dos norte-americanos no ensino superior do país e atribuem parte importante deste “desencanto” a uma crescente percepção de que as universidades estão reprimindo diferenças de opinião. Questionar, debater, suscitar dúvidas, atitudes que são inerentes à missão do acadêmico – e do jornalista, eu acrescento – tornaram-se posturas de alto risco frente à sanha dos donos da verdade.
Debruçados sobre um relatório da Foundation for Individual Rights and Expression, Pinker e Madras esfregam em nossos narizes um dado assustador. No período entre 2014 e 2022, foram registradas lá mesmo, na antiga pátria da liberdade, 877 – isso mesmo, quase 900 - tentativas de punir acadêmicos por algo que disseram ou publicaram, e em 60% destes casos os seus algozes levaram a melhor, conseguindo impor aos alvos de sua cólera sanções reais que incluíram censura (114 casos) e até mesmo demissões (156). Nem na era do macartismo o placar da intolerância atingiu tais níveis, anotaram os autores do artigo.
O pior de tudo, afirmam eles, é que “para cada estudioso que é punido muitos mais se autocensuram, por saberem que podem ser os próximos”. Este, para mim, é o ponto trágico da questão. O medo é uma doença silenciosa, e com alto potencial de contágio. Se abate cientistas e luminares do conhecimento, o que dizer do efeito que possa sobre ter os jovenzinhos que recém se lançam à jornada de compreensão de si mesmos e do mundo que os cerca? Aliás, no mencionado artigo os dois professores de Harvard assinalam que “a maioria dos alunos diz que o clima do campus os impede de dizer coisas em que acreditam”.
Sugiro aos resilientes do Fórum da Liberdade uma atenção para esta questão nas próximas edições do evento. E saúdo a iniciativa dos bravos de Harvard, como Drummond saudou a esperança, em 1945, com o poema “A Flor e a náusea”.
“Uma flor nasceu na rua!. (...) Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.”