Renato Portaluppi técnico ficará na história pelos títulos que conquistou e ainda pode conquistar, com o Grêmio e mais onde trabalhar no futuro. Mas o legado, no futebol, não se mede apenas pelo resultado. Seria uma crueldade com quem eventualmente perde por uma fatalidade, às vezes até sendo claramente melhor. A Holanda de 1974 é sempre o melhor exemplo. Perdeu e ficou na história por ser a última revolução do futebol. De lá para cá, tudo se transforma a partir da inspiração da Laranja Mecânica, sob o comando de Cruyff. Não sei se o Grêmio ganhará a Libertadores e o Brasileirão. Pode ser que não vença nenhum dos dois.
Na segunda-feira (1), conversei bastante com Muricy Ramalho, em São Paulo, depois do Bem, Amigos. Galvão Bueno gentilmente oferece um jantar, como bom anfitrião. O Muricy diz, com a experiência de muitas alegrias e tristezas, diz que é quase impossível ganhar o Brasil e o continente. O desgaste mental da Libertadores é terrível, capaz de se espraiar pelo clube todo, inclusive para quem não jogou. Se o Grêmio conseguir, quebrará um paradigma. Mesmo que não o faça, Renato terá dado uma contribuição ao futebol brasileiro. Foi ele, ao assumir radicalmente a ideia de usar dois times para suportar o calendário, quem encerrou a ladainha anual de poupar ou não poupar.
O Grêmio provou que não tem outro jeito. Força máxima cansada vira mínima, pela incapacidade dos titulares de darem o seu melhor, tanto técnica quanto fisicamente. É assim que o time reserva, agora sob o eufemismo de "alternativo", torna-se forte. De quebra, a preservação garante o que está acontecendo com o Grêmio agora. Todos estão à disposição para os jogos decisivos. Ramiro estará, até a ida da semifinal contra o River, no dia 24. Lembram do ano passado? Aconteceu rigorosamente o mesmo no mata ou morre da Libertadores. Este ano, todos copiaram a estratégia do o Grêmio, sem medo de abusar dos suplentes. Palmeiras, Cruzeiro, antes o Corinthians e o Santos. Todos.
O único que teimou em não ouvir Renato, escalando os mesmos quarta e domingo, quebrou a casa com um elenco milionário. O novato Maurício Barbieri, do Flamengo, não teve força para dizer não à turma do amendoim da Gávea, que reverberou a tese de ganhar tudo (é Mengão!). Cedeu, perdeu e foi demitido. Com as costas largas, Renato bancou time inteiro reserva em muitos jogos, ouvindo críticas da imprensa e até de boa parte da torcida do Grêmio.
— O futebol, hoje, é muito físico. Se você não cuidar dessa parte muscular o ano todo, e não só no segundo semestre, não tem jeito. E isso vale para todos. Não tem essa de fulano é menino e pode jogar todas. Vai estourar. Hoje, é muito assim. Não muito atrás, era menos. Hoje, não — disse Muricy, enquanto devorava um belo prato de salada.
Mesmo que Renato perca miseravelmente a Libertadores e o Brasileirão, ele só chegou às cabeças pela estratégia de preservar jogadores e usar os reservas como poucas vezes se viu numa temporada. Está provado que é impossível escalar força máxima o tempo todo. É questão de sobrevivência conjugar o verbo poupar. Acabou (aleluia!) aquele mimimi de todo o ano: preserva ou não preserva? Poupa ou não poupa?
A partir de 2019, é uma discussão que só vale para encher lingüiça. Tem de ser página virada, e quem a virou para o futebol brasileiro foi Renato.