
A cada jogo do Inter, em seu ano de retomada, o conceito de futebol do técnico Odair Hellmann vai se firmando. O que ele diz na entrevista, aos poucos, se vê traduzido no campo: posse de bola no chão, algumas vezes com marcação alta, mais finalizações do que o adversário e muita intensidade, tanto na transição para o ataque quanto na recomposição. Nem sempre a atuação é boa. Houve momentos em que foi ruim, inclusive. Na maioria das vezes, é satisfatória. Em todas há um padrão – esse é o ponto.
Até onde vai esse novo Inter ainda é uma incógnita, mas definir um caminho e andar nele com firmeza, passo a passo, é o alicerce sem o qual prédio algum se mantém em pé. Só que, para Odair se livrar do Balonismo Futebol Clube que viciou o Inter nos últimos anos, ele precisa de força física. Não há como trocar passes com movimentação, reagir imediatamente ao perder a bola e marcar sob pressão sem fôlego. Dentro desta ideia, a parte técnica e física são irmãs siamesas. E o Inter está correndo do mesmo jeito do início ao fim das partidas, inclusive virando placares (Juventude e Remo), algo raro no passado recente.
O torcedor colorado já conhece Odair Hellmann. Mas sabe quem é, ou como pensa, o preparador físico Cristiano Nunes? O Inter foi buscá-lo do outro lado do mundo, no Vissel Kobe, do Japão. É pai de três filhos: dois meninos, um de 15 e outro de 12 anos, mais a caçulinha, de seis. Tem 44 anos e nasceu em Campinas, no interior paulista. Fala-se pouco dele. Hora de conhecer melhor o homem que está fazendo o Inter correr.
Está correto afirmar que a ideia de futebol de Odair Hellmann exige mais dos jogadores na parte física?
Conheço o Odair desde 2014, no próprio Inter, quando vim para cá com o Abel Braga, uma pessoa importante na minha carreira, com quem trabalhei também na Ponte Preta, no Flamengo, no Fluminense, no Al Jazira. Odair sempre teve essa metodologia. Sim, você tem razão: nela, exige-se muito do atleta. Os jogadores têm de treinar muito duro para dar certo.
Como assim, “muito duro”?
É que se trata de trabalho integrado. De casar as duas partes, a técnica e a física. Elas têm de dialogar. Uma interfere na outra. Os exercícios técnicos e táticos que o Odair comanda já fazem parte do planejamento físico. Por isso, Odair e eu debatemos diariamente o trabalho do dia. É tudo interligado. Isso aumenta muito a exigência para o atleta. A conscientização dos jogadores foi absolutamente essencial nesse processo.
E os jogadores receberam bem a dureza do que viria pela frente?
Conversamos longamente com eles na pré-temporada. Explicamos que, nessa primeira parte, os treinos técnicos seriam necessariamente muito intensos. Aquela coisa de pingar suor mesmo. O lado físico seria concentrado em força e resistência. Se nós não puxássemos já no treino técnico, a qualidade da preparação física de cada um cairia ao ponto de ser insuficiente para cumprir a ideia de futebol do Odair, empurrando para baixo o rendimento coletivo. Jamais conseguiríamos terminar nossos jogos em cima do adversário sem os jogadores comprarem a ideia, como vimos contra o Cianorte.
A carga de cada jogador é administrada a partir de que dados?
Eles treinam e jogam com aparelho de GPS. Medimos volume, intensidade, distância percorrida, velocidade média, número de acelerações e desacelerações, mudanças de direção nos movimentos. Tudo repercute na exigência muscular. Vou armazenando dados e interpretando.
Qual a sua rotina diária?
Tento chegar umas duas horas antes do treino. Aí converso com todas as áreas: médica, fisioterapia, fisiologia, nutrição, todas elas. A comissão técnica se reúne diariamente, às vezes até em turno que não tem treino: estamos comprometidos e fechados para recolocar o Inter no seu devido lugar.
O que há com Leandro Damião?
No fim da temporada passada, ele começou a sentir dores no púbis e nos adutores. Como sua presença era decisiva na campanha para sair da Série B, ele não conseguia treinar como os outros. As dores o impediam. Já foi para as férias com essa defasagem.
Ele jogou no sacrifício?
Sim, pode-se dizer. Atitude e comportamento exemplares. Agora teve essa lesão na cervical, quando estava evoluindo, mas vai voltar.
Quando o Inter atingirá o ápice físico em 2018?
Em uma temporada longa e cheia, não se fala em ápice ou pico, mas em boa forma desportiva. Este é o objetivo. A maioria dos nossos jogadores está bem, mas agora vem o acúmulo de jogos, alguns decisivos. Aí entra a administração, à exceção dos reservas.
Por que excetuar os reservas?
Importante dizer isso: são os que mais treinam, justamente por não jogarem com frequência. Nossa preocupação com eles é total. Por isso não abrimos mão de usá-los no Gauchão. A reposição tem de estar a postos. Contra o Cianorte, tínhamos quatro ausências, mas o time não sentiu nenhuma delas.
Uma das críticas recorrentes nos últimos anos é de que a rotação do time cai no segundo tempo. A direção tocou neste tema ao buscá-lo?
Não deram conotação de sofrimento físico, não. Mas entendo que acreditaram no meu trabalho nesta parte da intensidade. Tanto que vim para a comissão permanente.
Quem são os campeões de fôlego do grupo de jogadores?
Quando me perguntam isso, respondo assim, para as pessoas entenderem e eu não fugir da resposta. Existem valências físicas diferentes e predominantes para cada jogador. Klaus é muito forte, assim como Patrick, Pottker e Damião. Outros têm prevalência na parte aeróbica a resistência. É o D’Alessandro: por isso o vemos suportando em alto nível as ações do jogo até o último segundo, inclusive as de marcação, mesmo aos 36 anos. Idem para Edenilson. Mas o importante é que a resposta do grupo como um todo tem sido boa.
E Iago, um dos destaques deste início de ano?
A resistência dele é incrível. Tem uma parte aeróbica fortíssima, mas precisa ganhar massa muscular. Faremos trabalho específico com ele e o Juan Alano, o que é normal com os mais jovens. O enfrentamento quem vem por aí é pesado.