Entrou uma mamangaba na sala aqui de casa. Ela era do tamanho de uma bola de pingue-pongue, e fazia muito barulho enquanto voava e dava rasantes, como um caça de guerra. Meu filho se assustou:
– Que que é isso???
– Uma mamangava – informei, com sabedoria paterna.
Falei mamangava, e não mamangaba, porque meus avós falavam assim, embora muitas pessoas me garantam que o certo é com bê, não com vê.
Meus avós tinham muito respeito pelas mamangavas. Diziam que elas eram brabas. Aliás, repare nessa palavra, brabas: também pode ser com bê ou com vê. Existe, de fato, uma relação meio promíscua entre o bê e o vê. Por que isso? Tenho de perguntar ao Cláudio Moreno.
Mas o que interessa é que meus avós viviam citando a ferocidade da mamangava. Até diziam, sobre alguém muito irritado: “Ele é brabo como uma mamangava”.
Uma vez, num verão, nós estávamos na casa dos meus avós e a minha madrinha Sônia resolveu queimar um ninho de mamangavas que havia no pátio. Ou será que o certo é dizer colmeia de mamangavas? Seja. Ela foi lá e tentou destruir a colmeia com uma tocha improvisada. Mas não conseguiu, e as mamangavas se irritaram. Saíram daquela colmeia às centenas, formaram um enxame e atacaram. Só deu tempo de o meu avô gritar para a madrinha:
– Corre!
Ela saiu na famosa desabalada carreira, gritando e agitando os braços, e as mamangavas atrás. Todos nós, eu e meus irmãos, minha mãe, meus avós, todos nós corremos para dentro da casa. Meu avô fechou a porta num estrondo, e minha avó cerrou as janelas. Foram rápidos, porque as mamangavas não conseguiram entrar.
Aí, sabe o que aconteceu?
Foi inacreditável. As mamangavas, furiosas na tentativa de invadir a casa e nos picar com seus ferrões, começaram a se chocar contra as janelas, como se estivessem batendo com um aríete para derrubá-las. Ficaram assim um tempão. E nós lá dentro, assustados, ouvindo o som horripilante que elas produziam.
Ou seja: mamangava é bicho brabo mesmo.
Mas a que entrou na nossa sala estava sozinha. Uma mamangava solitária até pode deixar a gente alerta, por causa do ruído alto que emite, mas um ser humano, ainda que pequeno, pode com ela. Foi o que disse para o meu filho, quando ele se assustou com o bicho: que ele podia enfrentá-la.
– Dá uma chinelada nela! – mandei.
E ele:
– Não!
Pensei: as novas gerações. Eles só querem saber de celular e computador, não jogam mais gude nem boco, não atiram bolinha de cinamomo com funda, não fazem carrinho com lata de azeite, não andam de carro de lomba, não jogam taco. Essa nova geração não desfruta a natureza. Eles não conhecem o mundo real, só o virtual! Eles não sabem nada sobre as mamangavas!
E tirei o chinelo, pronto para esmagá-la como a um inseto. Mas ele gritou:
– Não!
– Por que não?
– Porque não existem mais mamangavas no Canadá!
– Hein?
– No Canadá elas já não existem mais! Estão em extinção! E as mamangavas são importantes para a polinização. E a polinização salva a natureza!
Fiquei boquiaberto. Abri as janelas. Com um pano, fui empurrando a mamangava para fora, onde ela poderia polinizar à vontade e salvar a natureza. Meu filho ficou observando e depois voltou à tela do celular. Não reclamei. As novas gerações, afinal, podem aprender algo no mundo virtual.