Gostaria de saber mais sobre os guapuruvus. Miseravelmente, não sei. Sou um homem inçado de defeitos. Um deles, esse: pouco sei sobre guapuruvus. Na verdade, não sabia nada, até ler em GZH uma notícia a respeito de um indivíduo em especial, que se ergue na elegante avenida 24 de Outubro, na Capital de Todos os Gaúchos.
Esse guapuruvu, os homens querem matá-lo. Seu erro foi ter-se plantado em um condomínio onde vivem seres humanos, que estão incomodados com sua presença e sua atividade.
Em defesa do guapuruvu, apresso-me a esclarecer que, quando ele nasceu, o condomínio provavelmente não existia, porque, segundo a reportagem, ele, guapuruvu, tem 50 anos de idade. Então, em algum dia de 1970, alguém se ajoelhou no chão de terra fofa da 24 de Outubro, cavou um buraco e disse: “Vou plantar aqui um guapuruvu, e ele vai embelezar a vizinhança e alegrar toda a gente”.
Foi o que esse homem fez, e deu certo, porque o guapuruvu vingou e cresceu. Para bem imaginar como foi o meio século de vida desse guapuruvu, sabe o que fiz? Fui ao Google. Lá aprendi que o guapuruvu pode atingir 30 metros de altura e que suas flores são “grandes, vistosas e amarelas. O tronco é elegante, majestoso, reto, alto e cilíndrico. A casca, quase lisa, de cor cinzenta muito característica. Floresce principalmente durante os meses de outubro, novembro e dezembro”.
Fiquei encantado com a descrição. Tive vontade de sair à rua e ver guapuruvus, que, a esta hora, estão em flor.
O que de tão terrível essa árvore teria feito, para que as pessoas a sentenciassem à pena de morte? A matéria de GZH explicava: em um dia de vento, o guapuruvu não teve força suficiente para segurar um de seus galhos, que se desprendeu, caiu sobre um carro e lhe amassou a lataria.
De fato, há de se ter cuidado com os carros. Um carro bem lavado, reluzente e sem danos é coisa bonita de se ver. Mas há tantos deles enfeitando a 24 de Outubro, será que não poderiam compartilhar espaço com um único guapuruvu cinquentenário?
Os homens decidiram que não. O guapuruvu é muito perigoso, deve morrer. Contrataram uma empresa especializada nesse tipo de serviço e a empresa vem executando o guapuruvu aos poucos. Faz cinco semanas que o mutilam. Vi, no jornal, a foto do condenado. É uma imagem triste. Arrancaram-lhe todas as flores, os galhos foram amputados, restam só tocos. O tronco ainda é elegante, majestoso, reto, alto e cilíndrico, mas assim aleijado não expressa a dignidade tranquila de todas as árvores; expressa desespero.
Alguns moradores da redondeza estão tentando salvar o guapuruvu, mas encontram poderosa oposição. As pessoas que moram perto da árvore sentem medo dela, e pessoas com medo são perigosas.
Realmente, guapuruvus às vezes podem ser traiçoeiros, ninguém sabe quando um pé de vento os fará atacar outra vez. Mas será que os homens não podem dar um jeito de conviver com eles sem conflitos? Porque eles também podem ser a casa dos passarinhos e suas flores amarelas podem alimentar as abelhas. Suas copas frondosas podem dar sombra fresca e trazer alguma amenidade para a dureza do asfalto da avenida. E ele nem reclamará se, em seu tronco elegante e majestoso, algum apaixonado gravar a canivete o nome da amada. Ah, um guapuruvu pode se prestar a esses romantismos humanos, e os humanos podem ser românticos, podem amar outros humanos e os bichos e a natureza que os rodeia também. Os humanos, quando se esforçam bastante, acredite, os humanos podem ser até bons.