Tem um lugar aqui em Boston que se chama Timeout Market. Nome de algo muito americano, não é?
Não é.
Esse Timeout vem de Portugal. O que mostra que não é só no Brasil que o inglês às vezes é mais prestigiado do que a própria língua materna.
Mas talvez os portugueses tenham colocado esse nome no empreendimento exatamente porque pretendiam torná-lo internacional. E conseguiram. Existem Timeouts em vários países e não duvido de que logo abram um no Brasil.
O Timeout nasceu em Lisboa, no Mercado da Ribeira. Eles aproveitaram um grande prédio do século 19, um espaço amplo, do tamanho de uma fábrica, reformaram-no e lá alocaram alguns dos melhores restaurantes e bares da cidade. A condição para a instalação é de que a comida servida seja da melhor qualidade possível. Nas cozinhas, você encontra chefs com estrelas no Guia Michelin e tudo mais. Há mesinhas na rua, mas a bossa são as enormes mesas de madeira, como as de churrasco, atravessadas na parte de dentro.
Que graça há em jogar, trabalhar, amar e viver sem emoção?
Um lugar perfeito para fazer um Timeout seriam os armazéns do Cais do Porto – fica a sugestão para a prefeitura de Porto Alegre.
Decidi que vou experimentar todos os pratos que eles oferecem por lá. Já provei alguns, inclusive um clássico de Boston, o lobster roll, que tem um nome imponente, mas nada mais é do que um sanduíche de lagosta.
Vou fazer uma confissão que certamente me renderá narizes torcidos dos leitores gastronomicamente mais exigentes: prefiro o sanduíche de lagosta à lagosta em si. Sabe por quê? Preguiça. Comer lagosta dá muito trabalho, a gente tem que lidar com martelos e alicates, me sinto como um Torquemada supliciando um herege para a Inquisição. No sanduíche, a carne da lagosta já vem pronta, muito mais prático.
Há outro prato local que vale a pena provar no Timeout: o clam chowder, um creme branco de amêijoas. Sabe o que são amêijoas? O nosso vulgar marisco.
Mas não vou ficar descrevendo tudo o que comi ou que comerei no mercado, quero contar é sobre o que aconteceu no domingo passado, quando fui lá com meu filho. Ele queria provar o hambúrguer, que, dizem, é requintado como um suflê. Acontece que, naquela tarde, os Patriots enfrentavam os Redskins pelo campeonato de futebol americano. Os Redskins são de Washington. Significa “peles-vermelhas”, que era como os pioneiros americanos chamavam os índios. Há quem defenda que o time mude de nome, por ser politicamente incorreto. Os americanos são dados a essas revisões – às vezes, como no caso dos Redskins, exageradas.
Já os Patriots homenageiam os cidadãos que lutaram pela independência. É o time do Tom Brady, mais conhecido como marido da Gisele. Tom e time são paixões da cidade. Por isso, os americanos que foram ao Timeout no domingo sentaram-se todos de frente para os telões que transmitiam o jogo. Fiquei olhando para eles. Conversavam em voz baixa, comiam suas batatas fritas sem pressa, bebericavam goles de cerveja. De repente, baixavam a cabeça e se concentravam na telinha do celular. O jogo correndo, o Tom Brady lançando aquela bola que não é bola e eles serenos, como se estivessem assistindo à missa. Nenhum soco na mesa, nenhum “aaah”, nenhum “oh, my God!”, nada.
Como o Patriots não tem rival na cidade, não tem pressão; não tendo pressão, não tem emoção. Que graça há em jogar, trabalhar, amar e viver sem emoção? Você aí, gremista ou colorado, você que tem um rival no trabalho, você que compete por qualquer coisa em qualquer lugar, saiba de uma verdade: ter um bom inimigo é o que dá cor à vida.