Você lê um romance do Bukowski e fica bêbado. Seus personagens bebem o tempo inteiro, estão sempre tronchos de tanto se entorpecer com vinho barato ou cerveja morna. E eu, quando descobri Bukowski, passava por uma fase da vida em que podia estar dentro de um dos livros dele.
Cara, nós íamos ao supermercado Febernati ou ao Econômico e comprávamos vinho de garrafão. Três, quatro, cinco garrafões de vinho tinto de procedência ignorada, que consumíamos em uma única noite, como se não houvesse amanhã – e, às vezes, não havia mesmo. O mais rico entre todos nós ganhava, no máximo, um salário mínimo e meio. Estourando, dois.
Quero que você tenha um verão divertido e dê presentes de Natal que façam diferença.
Éramos duros, durangos. O Fernando alugou um apartamento no andar térreo de um edifício na pororoca da Benjamin Constant com a Assis Brasil, um lugar barulhento, escuro e sempre encardido da fumaça dos escapamentos dos carros que rosnavam dia e noite, a quatro metros de distância. Aquele tugúrio se tornou a nossa sede. Lá fazíamos as festas e nos homiziávamos para namorar as eventuais (e raras) conquistas amorosas. Uma noite, quando estávamos com o orçamento um pouco mais bem fornido, enchemos dois carrinhos de supermercado com garrafas de cerveja e outro com salsichão e pão. Foi um banquete.
Bukowski falava comigo, naqueles dias. Henry Chinaski, o alter ego do Velho Buk, era como alguns de meus amigos. De seus romances, talvez o meu preferido seja o primeiro, Cartas na Rua, em que ele conta suas aventuras como carteiro temporário. Sempre que encontro o carteiro aqui do meu bairro, o bom Mark, lembro-me de Chinaski. Acho-os parecidos.
Uma vez, fiquei sabendo que o escritor preferido de Bukowski era John Fante. O principal personagem de suas novelas chama-se Arturo Bandini, que estava para Fante como Chinaski estava para Bukowski. Só que Bukowski não queria ser Chinaski; queria ser Bandini. Tanto que, quando discutia com alguma de suas mulheres, ele gritava:
– Você não pode falar assim comigo! Sabe quem eu sou? Bandini! Eu sou Arturo Bandini!
Isso me fez procurar pelos livros de Fante e, oh, o Velho Buk tinha razão. O homem escrevia com as entranhas, escrevia com o sangue ainda quente.
Há quatro livros com Bandini de protagonista, todos ótimos e dois especiais: Pergunte ao Pó e Espere a Primavera, Bandini. Leia-os!
Você já deve ter percebido que estou dando sequência às minhas indicações de livros de autores norte-americanos. Quero que você tenha um verão divertido e dê presentes de Natal que façam diferença. E farão, acredite: esses dois, Bukowski e Fante, podem transformar vidas. Podem fazer de alguém uma pessoa melhor.
Para arrematar, vou listar outro autor que tem algo a ver com eles: Kurt Vonnegut. Ele, o Velho Buk e Fante são os três tigres nem sempre tristes da literatura americana. Como Bukowski, Vonnegut vinha de família alemã. Mas, na II Guerra, lutou ferozmente ao lado dos Aliados. Acabou sendo preso pelos nazis e levado para trabalhar em um frigorífico em Dresden. Era o que estava fazendo quando os Aliados lançaram o monstruoso ataque à cidade, transformando-a em um inferno de ferro e fogo. Vonnegut ficou preso no frigorífico durante alguns dias e foi essa a inspiração para um de seus livros mais impactantes, Matadouro 5. Em Vonnegut, você vai encontrar a mesma selvageria poética de Bukowski e Fante. Os três parecem maus, mas, na verdade, são almas sensíveis que não se adaptam ao sistema. Encontre-os, leitor. E talvez você encontre a si mesmo.