Todo mundo tinha medo do clã dos Pontes. João, Daison e Bibiano Pontes, guardando a defesa do Gaúcho de Passo Fundo, eram como Cérbero, o cão de três cabeças que guardava a porta do mundo inferior do Tártaro. Ninguém passava.
O Inter buscou um deles, Bibiano, para calafetar sua zaga, nos anos 1970. Deu certo. Bibiano impunha respeito como os outros dois Pontes e era mais rápido do que eles. Nenhum atacante o vencia na corrida. Até que o Inter foi jogar contra o América do Rio e um centroavante negro, jovem e esguio passou a noite enfiando a bola goela adentro de Pontes. O rapaz era o que o Guerrinha chama de "cavalo quarto de milha". Zunia área adentro, deixando Pontes bufando lá trás. Era o Papa-Léguas contra o coiote.
Os dirigentes do Grêmio, vendo aquela apresentação histórica, correram para o América. Queriam aquele centroavante de qualquer jeito. Conseguiram. E deram, em troca, dois grandes jogadores: o ponta-direita Flecha, que havia sido convocado para a Seleção, e o volante Ivo Wortman, hoje técnico de futebol.
Tarciso chegou ao Grêmio e foi logo reconhecido não só por sua velocidade, mas por sua técnica e sua capacidade de conclusão. Foi titular absoluto. O problema é que, do outro lado, havia um Inter não apenas com Pontes, mas com Falcão, Carpegiani, Valdomiro, Lula e, sobretudo, Figueroa. Era Figueroa a última instância colorada para tentar deter Tarciso. E ele detia, nem sempre de forma lisa. O célebre cotovelo de Figueroa foi acionado várias vezes contra Tarciso, inclusive quebrando-lhe o nariz. Normal para um tempo em que, para levar cartão vermelho, um jogador tinha de dar um tiro no outro.
Era o maior Inter de todos os tempos, o campeão brasileiro. Depois de um Gre-Nal perdido, mais um, Tarciso desabafou:
– Não aguento mais perder para esse time do Internacional…
Mas ele aguentou. Tarciso tinha o que hoje se chama de "resiliência". Em 1975, depois de três anos sem vencer Gre-Nal, o Grêmio enfim derrotou o rival, naqueles 3 a 1 em que Zequinha marcou três gols. Neste jogo, o técnico Ênio Andrade mandou Tarciso correr pelos flancos, antecipando a mudança tática que seria consagradora em sua carreira.
O ano seguinte, 1976, talvez tenha sido o pior de todos para Tarciso: ele perdeu a posição para um centroavante de dois metros de altura que viera de Belém do Pará: Alcino. Mas, no começo daquela temporada, Oswaldo Rolla, o "Foguinho", em sua última passagem pelo Grêmio, vaticinou: Tarciso tem de ser ponta-direita.
Em 1977, outro mago, Telê Santana, teve idêntica compreensão. Empurrou Tarciso para a ponta e montou um ataque com ele, André e Éder. Não tinha como o Grêmio não ser campeão. Foi. E não deixou mais de ser. Com Tarciso marcando gols sem parar e servindo os companheiros de meio de ataque, o Grêmio ganhou todos os campeonatos que eram disputados e foi convocado para a Seleção Brasileira.
Nos anos 1980, um novo ponta-direita surgiu no clube, um gringo arrojado chamado Renato Portaluppi. Ênio Andrade consumiu um ano se debatendo com um dilema: como colocar aquele jovem no time, se o titular era Tarciso, o Flecha Negra, o segundo maior goleador da história do Grêmio? No ano seguinte, Espinosa deu a resposta: escalou os dois juntos e, assim, o Grêmio conquistou o mundo. Tarciso terminou a carreira como campeão de tudo. Gremista por adoção, adotou também Porto Alegre, de onde nunca mais saiu. Elegeu-se vereador, trabalhou pela cidade, amou-a e por ela foi amado. Era um homem simples, honesto e bom. Um homem de quem todos gostavam. Sem dúvida, um campeão.