Parece que há, no Brasil, alvoroçado debate acerca de aulas de educação sexual nas escolas. Bolsonaro é contra. Vários educadores são a favor.
Nunca tive aula de educação sexual. Deve ter me feito falta, mais do que aos adolescentes de hoje, suponho. Hoje eles têm a internet, os canais de TV, e tudo é muito aberto, muito explícito. Naquela época, não. Naquela época, sexo era misterioso.
Não estou falando de aulas sobre aparelho reprodutor ou doenças sexualmente transmissíveis. Isso não é sexo, isso é biologia. Agora, uma aula de educação sexual de verdade deveria ser algo bem útil para nós, naqueles tempos nebulosos.
Elas, com a mesma idade que tínhamos, eram tremendamente superiores. Elas brincavam conosco. Caçoavam de nós.
É que éramos ignorantes. Olhávamos para aquelas esfinges, as mulheres, e não conseguíamos decifrá-las.
Lembro, por exemplo, de uma tarde especialmente quente em que eu e o Jorge Barnabé estávamos sentados no degrau de entrada de um dos prédios da Coorigha, ali na Plínio, sem nada para fazer. Conversávamos devagar, o calor nos amolentava os músculos e as ideias. Então, vimos que a Alice e a Josie saíram da porta de outro prédio e vieram em nossa direção.
– Olha lá aquelas duas – falei.
Elas vestiam shortinhos sumários e blusas leves. Vinham caminhando com uma ondulação de quadris que as meninas aprendem de repente, em meio às férias de verão ou a uma primavera mais intensa.
– Oh, Deus… – gemeu o Jorge.
Elas chegaram e pararam bem na nossa frente, decididas. Não disseram nem oi, apenas nos atiraram no colo uma pergunta explosiva:
– Sejam sinceros: vocês queriam transar conosco?
Eu e o Jorge nos encaramos de olhos arregalados. Será que nossos sonhos seriam enfim realizados? Não fazia muito tempo, estávamos todos reunidos lá em casa, falando sobre mulheres, e o Roys, o famoso goleiro Languiça, suspirou:
– Quando será que vamos transar pela primeira vez?
Sim, tratava-se de uma humilhação, mas, sim, tratava-se de uma verdade: éramos virgens como freirinhas. E agora as duas sílfides surgiam com aquela proposta, como se estivéssemos dentro de uma pornochanchada do David Cardoso. Sabíamos o que acontecia no resto do roteiro: íamos nos dar bem! Oh, sim! Elas continuavam ali paradas, de pé, esperando pela nossa resposta à pergunta inacreditável: queríamos transar com elas, afinal? Respondemos ao mesmo tempo, em coro entusiasmado, levantando-nos de um pulo:
– Claro que sim!
Elas se entreolharam.
– Viu? – rugiu a Alice. – Eu te disse que eles não são de confiança!
– Não são mesmo! – ralhou a Josie.
E giraram nos calcanhares e foram-se embora, marchando de indignação. Ficamos parados, boquiabertos, sem entender nada: havíamos caído numa cilada.
As meninas sabiam das coisas. Nós, não. Nós apenas admirávamos aqueles seres complexos, cheios de vontades esconsas e escaninhos secretos no corpo e na alma. É verdade que já havia alguma literatura a respeito. A minha mãe trabalhava na Editora Abril e voltava para casa com a Revista Nova. Não sei se ainda existe a Revista Nova. Era uma publicação admirável. Em todas as edições havia reportagens alentadas a respeito de como era difícil satisfazer as mulheres. O homem devia cumprir um rosário de exigências, algumas bastante sutis: não seja apressado, nem lento demais; tenha “pegada”, sem ser agressivo; cavalheirismo e ousadia ao mesmo tempo; cuidado com o que fala, cuidado onde toca! Cristo!
Segundo a Revista Nova, era preciso saber manipular o ponto G, delicadíssimo, e também o clandestino ponto A, localizado em lugares de acesso restrito. Para nos orientar, a revista publicava gráficos, mapas, ilustrações pormenorizadas. E você acha que adiantava? Nada! Só nos deixava mais ansiosos.
Um dia, li na Revista Nova que mulheres, em viagens solitárias, levavam escovas de dentes elétricas para a autossatisfação. Contei para o Plisnou e ele se espantou:
– É sério que as mulheres fazem isso?
– Fazem. Espero que com cerdas macias.
Sim, senhores, devo admitir: nossa geração carecia de aulas de educação sexual.