Quero sangue! Quero cabeças cortadas! Quero terra arrasada! Culpados! Achem os culpados!
É o que meu coração pede.
Mas, tudo bem, vou me conter. Quem escreve em jornal tem de ser ponderado. Tem de ser cérebro, não coração.
Parcimônia. O público clama por parcimônia.
Mas e o meu filho? O Bernardo queria tanto que o Brasil fosse campeão… Ele usa aquela camisa amarela com tanto orgulho, ele queria ir à aula com a camisa do campeão do mundo. Esses caras, Fernandinho, Paulinho, Alisson, Miranda, Willian, Gabriel Jesus e até o Neymar, esses caras deixaram o meu filho triste. E outros tantos filhos também. As criancinhas estão chorando de Uruguaiana ao Acre, por causa desses sujeitos.
Então, minha gana é acabar com reputações.
Só que não farei isso. Buscarei o meio-termo. Buscarei compreender. Vamos lá.
Em primeiro lugar, há que se destacar que esse time da Bélgica tem suas qualidades, mas não é o último bombom com licor da caixinha comprada em Bruges. O time do Brasil é melhor, e até provou isso em campo. Perdeu pelo menos 10 gols, acertou bola na trave e teve um pênalti legítimo não marcado pelo juiz. Foram 26 chutes a gol do Brasil e oito da Bélgica.
Então, por que perdeu?
Nessas circunstâncias, lembro sempre de uma frase de um dos maiores vencedores do futebol mundial, Elias Figueroa, que ensinava, com ponto e vírgula e tudo:
"Vitórias não se merecem; se conquistam".
O Brasil mereceu vencer, mas quem conquistou a vitória foi a Bélgica. Porque alguns jogadores do Brasil, mais uma vez, assustaram-se com o tamanho do empreendimento. Não lhes falta talento. Falta-lhes personalidade. Entre esses, o maior de todos: Neymar. Assim como o besuntei de elogios quando ele foi responsável por pelo menos duas vitórias nesta Copa, tenho de dizer que Neymar, nesta sexta-feira (6), em Kazan, fracassou rotundamente. Com o fracasso, tudo aquilo que era perdoável tornou-se condenável. Sua vaidade extrema, sua infantilidade e sua arrogância não teriam importância se, na hora de decidir, ele decidisse. Não foi o que aconteceu. Neymar está muito abaixo do que poderia ser. E do que acha que é.
No ano da graça de 2001, escrevi: a Lei Pelé vai matar o futebol brasileiro. Em 2002, o Brasil venceu sua última Copa. Naquela Seleção, havia jogadores de formação genuinamente brasileira: Ronaldinho, forjado pelo Grêmio; Rivaldo e Roberto Carlos, pelo Palmeiras; Cafu, pelo São Paulo. Entre outros.
Agora, os jogadores do Brasil saem de seus clubes antes de ficarem prontos. Jogam um ano nos profissionais e já são levados para o Velho Mundo, que é, mais do que velho, um outro mundo. Alguns têm o seu estilo de jogar deformado, como Anderson e Pato. Outros viram milionários mimados, superprotegidos, completamente indiferentes à realidade brasileira.
Não é culpa deles. A maioria desses jogadores sai direto da precariedade da pobreza para uma vida principesca. Como não se amolentar com o luxo e os prazeres fáceis?
São poucos os que mantêm a simplicidade, como Taison, ou que aproveitam a oportunidade para crescimento intelectual, como Geromel.
Não é por acaso que o melhor jogador do Brasil é Neymar. Ele teve tempo de maturação no Santos. Mas a vida de sultão está mexendo com ele. Como mexeu com Ronaldinho. E, talvez, mexeria comigo e com você.
O jogador que antecipou esse sequestro do futebol brasileiro pelos piratas europeus foi Paulo César Caju. Em 1974, ele foi contratado pelo Olympique de Marselha. Durante a Copa da Alemanha, Paulo César jogou bocejando. Saiu do jogo em que o Brasil foi eliminado pela Holanda dizendo que pouco se lixava para a Seleção Brasileira. Depois, virou um playboy. Em 1979, o Grêmio ainda o recuperou, ele fez um grande ano e ajudou o clube a ser campeão gaúcho. Mas não era mais o mesmo jogador.
Paulo César era craque. Como Neymar. Mas, como Neymar, poderia ser muito maior, se não fosse um deslumbrado.