Quando o problema surge, nossa tendência é perguntar quem é o culpado, antes mesmo de perguntar qual é a solução. É uma característica brasileiríssima, e tem suas razões: há, realmente, muitos culpados entre nós.
Neste caso da crise dos transportes, há ainda uma terceira pergunta a responder: quem ganha com a continuidade da greve dos caminhoneiros?
O culpado os brasileiros já decidiram quem é: Temer. É fácil culpar o Temer. Seu governo é fraco e impopular, uma delícia para as oposições. E, de fato, ele lidou mal com a crise, porque, sabendo que podia acontecer, não se preveniu, e, tendo acontecido, demorou a reagir.
Mas Temer não é o único culpado. Nem mesmo é o maior culpado. Há antigas responsabilidades nisso tudo. Os governos anteriores subsidiavam o preço dos combustíveis a expensas da Petrobras. É como se você tivesse uma fruteira e, para manter a freguesia feliz, comprasse a batata por R$ 10 e a vendesse por R$ 8. Sua fruteira, obviamente, quebraria. A Petrobras, que é um pouco maior do que uma fruteira, acumulou uma dívida de US$ 100 bilhões em 2016, com essa política. Agora está em US$ 88 bilhões. Isso sem contar o prejuízo causado pela corrupção, que é difícil de medir.
A gestão de Pedro Parente, portanto, acertou ao tomar medidas para arrancar a Petrobras das garras do governo. Só que a conjuntura internacional não espera pelo saneamento financeiro de ninguém. Trump anda às turras com o Irã e com a Síria, e os preços do petróleo passaram a aumentar demais. Como fazer para manter a freguesia feliz? O governo poderia cortar os impostos sobre o combustível, receita recomendada pelos sindicatos dos caminhoneiros. Mas aí o governo arrecadaria menos. Ganhando menos, teria de gastar menos. Para gastar menos, teria de promover cortes. E outro pedaço da freguesia ficaria infeliz.
Pensando assim, você chega à conclusão de que Temer foi mesmo culpado por essa crise, embora não tenha sido o culpado pelas causas profundas que levaram à crise.
Mas é claro que, se você chega ao supermercado e não encontra pão e leite, você não vai responsabilizar todo um modelo que começou a ser desenhado lá atrás, nos anos 1950, quando a Petrobras foi criada e o transporte ferroviário passou a ser depreciado.
Mas é claro que, se você chega ao supermercado e não encontra pão e leite, você não vai responsabilizar todo um modelo que começou a ser desenhado lá atrás, nos anos 1950, quando a Petrobras foi criada e o transporte ferroviário passou a ser depreciado. Não. Se você for petista, vai ignorar que os governos anteriores devastaram as finanças da Petrobras e gritar: "Mamãe Dilma, papai Lula, socorro! Venham nos salvar desse malvado que está a serviço do capital internacional!". Se você for antipetista, vai responder: "Quem é que elegeu o Temer?".
Esse tipo de discussão faz bem, porque não tem nenhuma consequência. O problema é o discurso que remete à terceira pergunta que fiz parágrafos acima: quem ganha com a continuidade da greve?
Bem.
Essa greve começou com o apoio de todos, porque todos sofrem com o aumento dos combustíveis. Mas, apesar de o governo ceder, a greve não acabou e, agora, todos sofrem com o desabastecimento, mais até do que com o combustível caro.
A que isso pode levar?
Para quem 200 milhões de dedos indicadores brasileiros vão apontar?
Para Temer.
O PT tinha os sindicatos a defendê-lo, além de uma militância quase religiosa. Temer? Ninguém se bateria por Temer. É um governo que cai com um peteleco, quanto mais com uma quartelada.
O Brasil é um país complexo, é preciso ter cuidado com ele. Hoje, o agravamento da crise serve aos aloprados. Aos que anseiam pela exceção antidemocrática. Talvez você tenha que defender Temer no Facebook.