Você quer saber para onde o povo está olhando?
Observe os artistas.
Se os artistas estão olhando para um lado, o povo está olhando para o outro.
Vale para o Brasil, vale para os Estados Unidos. A eleição de Trump o demonstra. Os artistas americanos gritaram quase que em uníssono contra Trump e em favor de Hillary. Deu no que deu.
O que mobiliza os artistas brasileiros hoje? A intricada questão "infância-sexo-gênero-arte", tornada crítica depois da exposição Queermuseu em Porto Alegre e do peladão do MAM em São Paulo.
Eu aqui, em minha estrondosa irrelevância, havia dado o assunto como encerrado. Não pretendia pensar mais nisso. Para mim, não se veta exposição de arte e não se boicota museu. Ponto.
Mas as manifestações dos artistas começaram a me inquietar. Passei a prestar atenção no que eles diziam e nas reações das pessoas ao que eles diziam. Se os artistas estavam tão coesos, se tinham todos a mesma opinião, era óbvio que havia alguma coisa errada.
Note: continuo contra e sempre serei contra a censura a manifestações artísticas, o boicote a museus, a mostras de arte, a peças de teatro, mesmo que sejam ruins.
O que os artistas não conseguem ver, o que eles não conseguem respeitar é que a população tem razão, sim, de recear por seus filhos.
Neste fim de semana, inclusive, levei meu filho para ver a mostra de Rodin no Metropolitan, de Nova York. O Pensador, o maior clássico de Rodin, está nu em bronze. As belíssimas estátuas gregas e romanas deste grande museu representam homens nus, com seus pequenos pênis flácidos a descoberto sem nenhum pudor. Na ala dos impressionistas, reencontrei um quadro que citei numa crônica, dias atrás: aquela camponesa nua que emerge das águas de um rio, pintada por Courbet e chicoteada pelo imperador Napoleão III (a tela, não a camponesa). Não havia pornografia em nada disso. Não havia acinte em nada disso.
Andando por entre as obras-primas do Metropolitan, fiquei cismando: será que as mais conservadoras senhorinhas do interior mais recôndito do Brasil ficariam chocadas ao ver o que meu filho estava vendo naquele momento?
Respondi para mim mesmo que não. É evidente que não. O medo da população é outro.
Então entendi: o que os artistas não conseguem ver, o que eles não conseguem respeitar é que a população tem razão, sim, de recear por seus filhos. Lembre-se que, na mesma semana da performance no MAM, um homem foi preso por atacar uma menina de cinco anos de idade no corredor de um supermercado em Porto Alegre. No MAM, uma menina de quatro anos alisou a perna de um homem nu. E se alisasse o pênis? A mãe pularia para puxar a mão da filha? Ou permitiria, em nome da grandeza da arte?
Crianças de quatro anos de idade conversam com bichos de pelúcia, misturam realidade com fantasia. Uma menina de quatro anos de idade sabe que aquele homem nu é "arte"? Se outro homem tirar a roupa diante dela, em outra circunstância, ela saberá se aquela nudez é abstração ou realidade? Outras crianças pequenas, vendo aquela criança pequena acariciar um adulto nu, saberão quando esse ato é ou não é arte?
É isso que chocou as pessoas! Como é que Caetano Veloso, um homem sempre tão sensível à alma do povo, não percebeu que o brasileiro tem medo? Que os filhos dos brasileiros estão expostos ao assédio do tráfico, do sexo prematuro e da violência diária e banal?
O MBL percebeu. E está se valendo politicamente disso. O MBL, hoje, é o grupo político que mais entende a alma do povo brasileiro. Porque vê que o brasileiro tem medo. Usa este sentimento. Ganha com ele.
Nenhum sentimento é mais perigoso do que o medo. E nenhum grupo humano é mais perigoso do que aquele que sabe manipular o medo.